Título: Alencar diz que pode deixar Defesa e embaralha ainda mais a reforma
Autor: Fabiana Cimieri e Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2005, Nacional, p. A4

O ministro da Defesa e vice-presidente José Alencar colocou mais lenha na fogueira das hesitações sobre a reforma ministerial ontem quando, depois de uma palestra na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, no Rio, disse que sua saída do cargo "não seria uma surpresa". Se Alencar sair, o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, pode ocupar o Ministério da Defesa, cargo para o qual já foi especulado. Em Brasília, no fim da tarde, Alencar abrandou suas declarações e disse que só deixaria o ministério se fosse para viabilizar a reforma. Outra especulação suscitada ontem foi que a saída de Alencar abriria espaço para o ex-presidente José Sarney, que assumiria a Defesa. Em São Paulo, Sarney desmentiu categoricamente que pudesse aceitar o cargo. "Essa chance é igual a zero", disse. Um assessor explicou que a única reivindicação do ex-presidente se restringe à nomeação de sua filha Roseana Sarney. Para qual ministério, ninguém ainda sabe, nem Lula definiu.

Em Brasília muitos aliados do governo Lula enxergam no demorada e enviesada reforma ministerial sinais desconfortáveis de hesitação e insegurança do governo. "Ninguém agüenta mais" - é a frase mais ouvida entre os aliados. Alguns deles, ontem, explicavam que o presidente parece testar a paciência dos aliados, porque muda de opinião a todo momento, cedendo às pressões dos petistas ou reabrindo situações já equacionadas.

Esse retrato se reproduziu ontem quando o Ministério da Defesa foi abruptamente lançado na dança das cadeiras pelo próprio vice-presidente, que o ocupa há apenas quatro meses. Enquanto Alencar, generosamente, abria mão de seu cargo, Aldo Rebelo dizia que Lula não lhe falou até agora sobre sua eventual saída. E marcou a posição de seu partido, o PC do B: "Não há sentido em um partido apoiar o governo sem participar dele", disse.

Aldo, sem mencionar sua incômoda situação das últimas semanas - quando viu seu nome ser sistematicamente "fritado" pelo PT -, afirmou ontem em São Paulo que o País não pode ter partidos de primeira e segunda categoria, uns que apóiam o governo e participam dele e outros que apóiam mas não dispõem de cargos no Executivo. "A reforma tem como objetivo dar mais eficiência e estabilidade à base política, que dá sustentação ao governo", opinou.

No Rio, mais cedo, o vice-presidente Alencar surpreendera os jornalistas quando, inesperadamente, colocou-se em xeque: "Meu perfil é inadequado para o Ministério da Defesa porque minha cultura é empresarial", disse. E foi adiante, numa seqüência gratuita de confissões: "Eu não entendo desses assuntos", prosseguiu, referindo-se às questões militares. Segundo ele, sua gestão tem sido marcada pela colaboração que recebe dos comandantes das três Forças.

Ele recorreu a uma frase de um ex-ministro do governo Figueiredo (Eduardo Portella, então ministro da Educação) para justificar a sua disponibilidade em sair da Defesa: "Eu não sou ministro, eu estou ministro."