Título: Em meio à crise, R$ 46 mi esquecidos
Autor: Silvia Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2005, Metrópole, p. C6

Recursos da União, do Estado e do Município ficaram parados em contas da Prefeitura sem render; tucanos querem ressarcimento À porta, credores cobram pagamentos atrasados. Em dificuldades financeiras, a Prefeitura decide cortar despesas: reduz serviços e cancela contratos com fornecedores para fechar o ano no azul. Por outro lado, mais de R$ 46 milhões ficaram parados em algumas de suas contas bancárias, sem rendimento ou aplicação. É o que mostra um rastreamento feito pelo governo José Serra em contas da Prefeitura. Para os tucanos, a situação prova o "descontrole administrativo" da gestão anterior. Segundo o secretário municipal de Finanças, Mauro Ricardo Costa, em 31 de dezembro de 2004 o Município tinha R$ 45,9 milhões parados em 66 contas especiais para receber recursos da União e do Estado para convênios com o Município e outros R$ 494 mil em 10 contas de livre movimentação da Prefeitura, as contas movimento.

O valor foi descoberto em 20 de janeiro, quando o dinheiro passou a ser aplicado. Costa apura os motivos e o período em que o dinheiro ficou sem rendimento. "Conta por conta está sendo analisada e até o fim deste mês teremos as informações", afirmou.

Pelo menos duas já foram analisadas. Segundo o secretário, uma delas está parada há três anos. Trata-se de uma conta movimento, cujo saldo em 31 de dezembro era de R$ 175 mil. A outra, uma conta vinculada a um repasse para a habitação, tem R$ 869,2 mil parados desde outubro. O restante das contas ficou parado por pelo menos 20 dias.

O Estado teve acesso com exclusividade aos extratos das contas. Os saldos variam de R$ 382,00 a R$ 16,4 milhões. São recursos, em sua maioria, enviados pelo governo federal para custear obras e programas para os quais foram firmados convênios - e não podem ter outra destinação.

A conta com maior quantia sem aplicação é a do Programa Especial de Habitação Popular para o Centro, com R$ 16,4 milhões. Na conta referente às obras de prolongamento da Avenida Jacu-Pêssego, na zona leste, há R$ 4,1 milhões. O programa social Renda Mínima, vitrine do governo Marta Suplicy (PT), também está entre as contas sem remuneração. Neste caso, o saldo é de R$ 3,7 milhões.

Para o governo tucano, é mais um exemplo de "descontrole administrativo". "É um descaso com o dinheiro público e um completo descontrole administrativo e financeiro", criticou Costa.

A situação será incluída no relatório final das contas da Prefeitura de 2004 a ser encaminhado ao Tribunal de Contas do Município até 31 de março.

PUNIÇÃO

De acordo com o Ministério da Fazenda, todo recurso transferido para essas contas tem de ser, obrigatoriamente, aplicado em caderneta de poupança (se a previsão de uso for superior a 30 dias) ou em um fundo de rendimentos de curto prazo (para período inferior a 30 dias). Se não o fizer, o Município pode ser punido, tendo de reembolsar a União pelo rendimento perdido. Em caso de sobra de dinheiro, ele precisa ser devolvido ao Tesouro Nacional.

Pelos cálculos de Costa, os R$ 46,4 milhões renderiam cerca de R$ 680 mil por mês. "Já começamos uma negociação com os bancos para receber parte desses rendimentos, já que eles usaram esse dinheiro parado nas contas."

Ele determinou ainda que a aplicação dos recursos transferidos pelo Estado ou União seja automática. Antes, o banco comunicava a entrada do recurso à Prefeitura, que pedia a aplicação.

A gestão Marta negou que tenha deixado recursos sem rendimentos. "Isso seria incoerente com a nossa situação financeira", informou em nota oficial. Disse que é provável que os recursos parados tenham sido transferidos nos últimos dois dias da gestão e que, portanto, a Prefeitura não teria sido comunicada da liberação em tempo hábil para solicitar a aplicação. Sobre as duas contas analisadas, informou que vai verificar, mas adiantou que elas "não devem expressar a totalidade das contas".