Título: Marta acusa Serra de fabricar o caos
Autor: Bruno Paes Manso
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2005, Metrópole, p. C7
Depois de 40 dias fora de SP, ex-prefeita dá maratona de entrevistas e denuncia `estratégia¿ tucana para desgastar sua imagem Depois de 40 dias no exterior, a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) voltou à capital na quarta-feira com disposição redobrada. Candidata assumida na eleição de 2006 para o governo do Estado, Marta passou ontem por uma maratona de mais de 14 horas, das 7 às 21h30, de entrevistas para emissoras de rádio e jornais. Aproveitou o palanque da mídia para denunciar o que considera uma estratégia deliberada de seu sucessor, José Serra (PSDB), para desgastar sua imagem. Para Marta, toda a polêmica sobre as dívidas deixadas por sua gestão - os tucanos calculam esse valor em R$ 2 bilhões - é fabricada: Como a senhora encara as críticas feitas por Serra à sua gestão neste início do governo tucano?
A dimensão que ele quis dar de descalabro e de irresponsabilidade financeira, com o andar da carruagem, foi dando para perceber que tinha uma estratégia. Ele parou todo o serviço da Prefeitura, é mato para tudo quanto é lado. Os CEUs interromperam todos os programas, até os programas da terceira idade. Piscinas todas fechadas nesse calorão, programação cultural encerrada. Aumento de tarifas. Para quê? Para dizer ela não deixou o dinheiro. É uma manipulação de tudo para desconstruir meu governo, que teve aprovação de 49% da população. Começou uma guerra do PSDB para 2006. Tem que desconstruir o meu governo para ganhar o governo do Estado.
A senhora mencionou uma estratégia deliberada de desconstrução do governo. Quando começaram as chuvas, os bueiros estavam entupidos, houve enchentes e muitos problemas nas ruas. Havia condição de os subprefeitos assumirem a todo vapor?
Sim. Havia condição de pôr imediatamente dinheiro disponível para as subprefeituras. Os subprefeitos tinham recursos para contratar as equipes que eles achassem necessário, do jeito que eles achassem necessário, mais ou menos, dependendo da dificuldade de cada região. Tinha dinheiro na conta para asfalto, para ele decidir.
Segundo Serra, havia R$ 332 milhões em caixa, mas as receitas eram vinculadas a determinados programas. Haveria apenas R$ 288 mil em caixa para serem usados. Ele diz que não havia como gastar esse dinheiro. É isso mesmo?
Realmente, parte da receita era vinculada. Mas você pode usar o dinheiro da saúde para fazer gastos na área que normalmente viriam da verba do orçamento. Propositalmente, houve uma ação para não utilizar nenhuma possibilidade de dinheiro, para poder dizer que havia um caos financeiro. Isso é uma estratégia que foi usada, mas, agora, quem está sendo punida é a população.
Como a senhora explica a fila de mais de 2 mil credores na prefeitura?
Isso me deixou indignada e me revolta a falta de respeito com os fornecedores, colocá-los em fila só para ganhar uma foto nos jornais. A Prefeitura disse que havia R$ 870 milhões a ser pagos para serviços que foram feitos e cujos empenhos foram cancelados. Isso ocorreu? Por que as pessoas foram cobrar da Prefeitura? Porque um mês antes de assumir, ele fez declarações dizendo que não ia pagar nada que não tivesse sido liquidado, já criando um clima para as pessoas que tinham a receber ficarem apavoradas. Os empenhos não haviam sido liquidados, mas, em uma continuidade administrativa, teriam seu trabalho analisado, liquidado e pago. Essas pessoas ficaram desesperadas. Ele chamou as pessoas de forma extremamente humilhante, para irem até a Prefeitura se cadastrar. Não precisava disso. O Alckmin também cancelou e o Fernando Henrique também. Eu não tinha prova de que o serviço havia sido feito. Por isso que eu pude cancelar. Tudo o que eu comprovei, eu fiz a liquidação e paguei.
O prefeito Celso Pitta disse que, em 31 de janeiro, a Prefeitura tinha R$ 503 milhões aplicados no mercado financeiro. Disse que deixou R$ 540 milhões de dívida e que por isso a Prefeitura conseguiu pagar os credores com relativa tranqüilidade. A situação financeira que o Pitta deixou para a senhora é melhor do que a que senhora deixou para o Serra?
Ai, meus Deus, cortina de fumaça é bom e eu gosto. Eu lembro que no meu discurso de posse, ele me deixou R$ 500 milhões a receber dos precatórios do parque Villa-Lobos que demoraram para entrar. Entrou picadinho. E ele colocou como se fosse uma verba real. Ele deixou R$ 1,9 bilhão de empenhos cancelados. Pior é que ele liquidou e cancelou, o que hoje não é permitido. E não deixou dinheiro. Eu tive que fazer uma renegociação com os credores, para manter a continuidade administrativa. E paguei. No primeiro ano, construímos um monte de pequenas obras na cidade, que não aparecem, programas sociais.
No caso dos túneis da Avenida Rebouças, foi uma saraivada de críticas. Essa análise do IPT mostrou que diversos pontos estavam malfeitos. Qual o motivo?
Tanto o Max Feffer quanto o Vieira de Mello não apresentam nenhum problema. Logo depois de perder a eleição, nossa administração percebeu que 500 metros da galeria não foram feitos de acordo com as especificações. Nós suspendemos o pagamento e mandamos refazer as modificações necessárias. Perdi a eleição e tínhamos que dar continuidade a isso. Chamamos os técnicos do Serra e falamos que não estava feito de forma correta e que não tínhamos pago. Falamos, vocês não paguem e cobrem. Não posso entender o circo que foi feito.
No balanço das 31 subprefeituras, a atual gestão afirmou que a dívida acumulada foi de R$ 150 milhões. Os subprefeitos estavam mentindo?
Não sei se eles estavam mentindo, eu não tenho esse dado. Mas eu gostaria de lembrar a população que quando eu recebi a cidade, não havia subprefeitura, não tinham nem computador. As pessoas trabalhavam sem condição de trabalho. Eu deixei 31 subprefeituras organizadas, com computador, praça de atendimento, 156, um serviço que funcionava bem. Se tem uma dívida, é incomensuravelmente menor do que qualquer coisa que eu possa ter recebido.
Como a senhora avaliou a discussão em torno do aumento da tarifa de ônibus?
Ele tinha já um plano de desarticular e desconstruir o que foi o meu governo, que foi bem avaliado nessa área. O que ele fica dizendo? Que no transporte não sobrou dinheiro, que tem um monte de linhas desarticuladas, mais má-fé ainda. O plano de transporte da cidade não era para ser implantado em quatro anos. Eu manteria a tarifa de R$ 1,70. Porque ele faz assim? É uma questão ideológica do PSDB. Eles não acreditam que o transporte público tenha que ser subsidiado.
E como a sra. vê a cidade hoje?
Foram 40 dias fora. Achei que seria adequado não me pronunciar nos primeiros cem dias para dar possibilidade ao novo prefeito para poder implementar suas ações e projetos. Quando cheguei, eu me deparei com o pessoal todo em polvorosa com o balanço que tinha sido publicado, pois era um balanço manipulado com meu nome e o do secretário de Finanças, o que é gravíssimo. Então fizemos uma interpelação extra-judicial para que refaça algo que não é correto.
A senhora é candidata a governadora?
Eu não seria sincera se não falasse que como política. Eu tenho vontade de servir e de poder servir a melhor proposta. Agora, a vontade não é pessoal, Tenho que pensar quem vai ter mais influência para a reeleição do Lula.
O que senhora faria diferente do Alckmin?
Acho que 12 anos de PSDB já cansaram. Eles não deram nenhuma resposta, ao contrário, haja vista a questão da Febem, uma chaga em que não tiveram nenhuma ação inovadora, enquanto fizemos os CEUs que têm um custo muito menor por criança. Eles tiveram uma política absolutamente fracassada na questão do jovem e do adolescente da Febem em 12 anos. Tiveram uma política de segurança que também não tem resultados satisfatórios.