Título: 'Cybervalentões' difamam colegas pela internet
Autor: Renata Cafardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/03/2005, Vida&, p. A11

Com o e-mail, os blogs e as mensagens no celular, a humilhação circula para um público maior NOVA YORK - A briga começou na escola, quando garotas da 8.ª série roubaram um estojo de maquiagem da nova aluna Amanda Marcuson e ela as denunciou. Mas não terminou lá. Assim que Amanda chegou em casa, as mensagens instantâneas começaram a aparecer na tela de seu computador. Era fofoqueira e mentirosa, elas diziam. Abalada, a menina respondeu: "Vocês roubaram minhas coisas." Na tela, se sucederam palavrões e palavrões como resposta. Naquela noite, a mãe de Amanda a arrancou da frente do computador para ir a um jogo de basquete com a família. Mas a enxurrada de insultos eletrônicos não parou. Ao fim do jogo, Amanda já tinha recebido 50 mensagens em seu celular - o limite da capacidade. "Parece que as pessoas conseguem dizer coisas muito piores para alguém online do que seriam capazes de fazer pessoalmente", disse a menina, de 14 anos, que mora no Estado de Michigan. As garotas nunca disseram uma palavra para ela.

Não mais confinados à escola ou aos horários diurnos, "cybervalentões" estão caçando suas presas nos próprios quartos. Ferramentas como mensagens de e-mail e blogs permitem que o bullying seja menos óbvio para os adultos e mais humilhante publicamente, já que fofocas, gozações e fotos embaraçosas passam a circular entre um público maior, pela internet.

Psicólogos dizem que a distância entre o agressor e a vítima na internet está levando a um grau de brutalidade sem precedentes. "Nós sempre falamos sobre proteger as crianças na internet de adultos e pessoas ruins", disse Parry Aftab, diretor executivo da WiredSafety.org, uma ONG que tem recebido telefonemas de pais e diretores de escola preocupados com o bullying virtual. "Nós esquecemos que às vezes precisamos proteger as crianças das crianças."

Susan Yuratovac, uma psicóloga da escola de ensino fundamental Hilltop, em Ohio, trabalha há anos para minimizar o bullying e agora passou a se preocupar com as agressões online. "Eu tenho crianças que chegam perturbadas à escola por causa de algo que aconteceu na internet na noite anterior", diz. "É muito nebuloso; não está acontecendo no refeitório, não está acontecendo no ônibus escolar, mas pode se espalhar rapidamente", disse Mary Worthington, educadora que faz palestras sobre o assunto.

As novas armas no arsenal adolescente de crueldade incluem roubar os apelidos online dos outros e enviar mensagens provocativas para amigos ou objetos de paixão, passar material particular para muitas pessoas e deixar anonimamente comentários pejorativos sobre colegas em blogs.

Listas online classificando as garotas da escola como gostosas, feias e sem graça também são comuns. A que apareceu na Horace Greeley High School, no Estado de Nova York, dava nomes, telefones e supostos feitos sexuais das meninas. Uma aluna da 7.ª série da escola Nightingale-Bamford, em Manhattan, disse que assistiu recentemente a um vídeo online em que um garoto cantava uma música para a garota de quem gostava e rapidamente se espalhou pela internet. "Eu realmente senti pena do sujeito", disse.

Psicólogos afirmam que os adolescentes são atraídos pelo ato simples de apertar o botão "enviar" e ver mensagens e fotos desaparecer, como se atitude não fosse real. "Não é o mesmo que pegar uma foto picante de sua namorada e mostrá-la a todos na escola enquanto você está lá segurando a foto", disse Sherry Turkle, psicóloga do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.