Título: Ex-presidente foi armado à última reunião do PDS
Autor: Rosa Costa
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/03/2005, Nacional, p. A7

O ex-presidente José Sarney confessou que estava armado com revólver de sua propriedade quando foi à última reunião do PDS, que ele presidia e era então o partido do governo militar. No programa Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo, que foi ao ar segunda-feira, ele disse que a decisão de empossá-lo foi tomada pelo deputado Ulysses Guimarães e o general Leônidas Pires Gonçalves, que seria ministro do Exército. Entre as confidências que fez na entrevista, Sarney contou que, após a internação de Tancredo Neves no Hospital de Base, Leônidas e Ulysses foram conversar com o ministro Leitão de Abreu, chefe da Casa Civil do governo Figueiredo. Leitão foi a favor da posse de Sarney e deu garantias de que o governo militar não reagiria. Muito tempo depois, confessou-lhe que o ministro do Exército, Walter Pires, pretendeu impedir a posse.

Segundo o relato, quando o chefe da Casa Civil contou ao ministro do Exército a combinação que havia feito, Pires discordou e disse que iria imediatamente para o Ministério do Exército "acionar o esquema militar". Leitão então blefou: disse-lhe que os atos de demissão dos ministros, por um equívoco, já tinham sido publicados. "Você não é mais ministro", teria dito. E Pires desistiu de resistir.

Sarney revelou que só soube da doença de Tancredo após seu discurso de despedida do Senado, quando o médico Renault Mattos Ribeiro, que operaria Tancredo naquela noite, lhe disse que ele seria internado no dia seguinte, após a posse. Sarney foi falar com Ulysses, que lhe revelou a verdade mantida em círculo restrito - ele, Ulysses, a família e os médicos.

Sarney reconheceu que seu governo, após a morte de Tancredo, tinha um enorme problema de legitimidade, que ele planejou superar com ações variadas. No campo político, cuidou de legalizar os partidos clandestinos. Pelo outro lado, distribuiu polpudas verbas para modernizar as Forças Armadas, incitá-las ao profissionalismo e promover o retorno aos quartéis.

Na área econômica sentiu a necessidade de adotar medidas que contivessem a inflação e pediu ao então ministro João Sayad que mandasse um assessor a Israel estudar o plano heterodoxo lá aplicado. Na volta foi montado o Plano Cruzado. Mas Sarney confessou que se arrepende de ter feito o Cruzado II, praticamente imposto por Ulysses e pelo PMDB.

Por várias vezes, na entrevista, Sarney admitiu que sabia ser "um presidente fraco", tanto quanto Tancredo seria "um presidente forte". Disse também que no dia em que deixou a Presidência reuniu a família em seu gabinete e comunicou que desceria a rampa, encarando o povo que aguardava pelo presidente recém-empossado, Fernando Collor. Ele esperava uma vaia, mas, segundo relatou, as reações se dividiram, para sua surpresa.