Título: Ministro ameaça quebrar patentes de drogas antiaids
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/03/2005, Vida&, p. A14

Posição do Ministério da Saúde é criticada por especialistas O ministro da Saúde, Humberto Costa, disse ontem no Rio que espera que os laboratórios americanos convocados pelo ministério cedam voluntariamente as patentes de quatro remédios usados no tratamento da aids. Anteontem, o Ministério da Saúde enviou cartas aos laboratórios Abbott, Merck, Sharp & Dohme e Gilead Science Incorporation pedindo o licenciamento voluntário para produzir os medicamentos mediante o pagamento de royalties. O ministro deu um prazo de 21 dias para que as empresas atendam ao pedido. Caso contrário, pode lançar mão do licenciamento compulsório, que quebra as patentes. De acordo com Costa, o governo decidiu partir para uma ação concreta diante do aumento dos gastos com a compra de anti-retrovirais do coquetel distribuído gratuitamente a 150 mil soropositivos. O ministério acaba de ampliar o número de contemplados para 180 mil. Os custos para a compra dos remédios subiram quase 80%, passando de R$ 550 milhões para R$ 900 milhões.

A atitude do ministério é acertada, mas fora de hora, avaliam especialistas. E, por isso, dificilmente trará resultados práticos a curto prazo. Ela ocorre depois de o governo perder feio nas negociações sobre preços de três medicamentos usados no tratamento de pacientes, que consomem, juntos, 66% de todo o orçamento do Programa Nacional de DST/Aids.

Neste ano, o desconto obtido foi de R$ 73 milhões, muito inferior aos R$ 300 milhões alcançados em 2004. As dificuldades nas negociações já haviam sido antecipadas por Alexandre Grangeiro, ex-coordenador do Programa de DST/Aids, que saiu do governo no ano passado por discordar da atitude pouco firme na condução da quebra de patentes.

A idéia do ex-coordenador era quebrar a patente dos medicamentos, comprar genéricos da Índia ou China até que laboratórios nacionais estivessem aptos a arcar com a produção. "Havíamos alertado que, quanto mais o tempo passasse, menor seria o poder de negociação do Brasil. Os resultados do último acordo demonstram isso", afirmou ontem, em Brasília.

Há, ainda, outro problema: a saída de Costa do ministério é dada como certa. Tal fato reduziu o impacto do seu "ultimato". A medida também é adotada num momento em que a própria rede de laboratórios oficiais, braço indispensável para tornar viável a quebra de patentes, enfrenta problemas de gestão.

O secretário de Vigilância em Saúde, Jarbas Barbosa, admite que tais problemas existem. "Mas, nas próprias tratativas da licença voluntária, esse problema pode ser superado. A estrutura pode ter avanços significativos, justamente com a licença."