Título: Auxílio a agricultor melhora cenário de um ano muito ruim
Autor: Renato StancatoJoão Baumer
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2005, Economia, p. B20

Pacote do governo e recuperação do preço dos grãos fazem analistas reverem previsões Custos mais altos, dólar mais baixo, falta de chuvas. Apesar de tudo isso, 2005 poderá não ser tão ruim para o agricultor brasileiro. Uma inesperada e aguda recuperação dos preços dos grãos nos últimos 30 dias está forçando analistas a refazer os cálculos para o setor. No início do mês, o ministro da Agricultura Roberto Rodrigues anunciou um pacote de medidas de auxílio ao agricultor empresarial. O pacote, aprovado quarta-feira pelo Conselho Monetário Nacional, prevê a renegociação caso a caso das dívidas de linhas de investimento que venceriam em 2005.

Do dia 2, data do anúncio do pacote, até 16, quando foi ratificado, soja e milho tiveram forte alta. O indicador da soja calculado pela Esalq acumulou alta de 15,77%, atingindo R$ 38,24 por saca no dia 16. O preço do milho, segundo a Fundação Getúlio Vargas, acumulou ganhos de 10,98%, sendo calculado em R$ 20,20 por saca.

Os preços da soja no Brasil subiram por causa da alta no mercado internacional. Na Bolsa de Chicago, por exemplo, os contratos para maio acumularam alta de 7,37% entre os dias 2 e 16 de março. A alta foi provocada pelos problemas climáticos na América do Sul e por um forte movimento de compra especulativa por fundos de investimentos. A alta do dólar também ajudou: no câmbio comercial, acumulou alta de 4,6% no mesmo período. Já os preços do milho sobem principalmente pelo clima no Brasil. Além de a seca ter quebrado a safra gaúcha, está afetando o plantio da segunda safra no Paraná.

Com o cenário mais favorável de preços, o presidente da Abag, Carlo Lovatelli, acredita que a ajuda do governo será canalizada para agricultores que perderam a safra de safra com a seca. Segundo ele, a renda parece recuperada, neste momento, nas áreas onde não houve perda climática. "A ação do governo deverá ser regionalizada, em favor do Rio Grande do Sul especialmente", reconhece.

QUEBRA

De fato, a seca foi devastadora para o Sul do Brasil: em relatório divulgado semana passada, a Conab estima quebra de 20% para a produção de milho e de 24% para a soja, na comparação com a expectativa de produção em outubro do ano passado. A situação é verdadeiramente dramática para os gaúchos. A safra de milho do Rio Grande do Sul é estimada em 2,162 milhões de toneladas, e a de soja, em 5,562 milhões de toneladas - e a Conab calcula quebra de 54% para a safra de milho e de 40% para a soja.

Em valores monetários, a Consultoria Céleres estima as perdas da região Sul por causa da estiagem em US$ 1 bilhão. Por outro lado, algumas regiões que não sofreram com a seca são beneficiadas pelos preços. No Mato Grosso, a recuperação de preço deverá dar receita adicional de R$ 695 milhões, segundo os consultores. E no Nordeste, a renda extra será de R$ 300 milhões.

A alta de preços também faz as consultorias refazerem os cálculos para as exportações de soja. Amaryllis Romano, analista da consultoria Tendências, acredita que o complexo soja deverá render US$ 9,21 bilhões em divisas para o Brasil em 2005. Embora menos do que os US$ 10,05 bilhões de 2004, o número já é mais otimista do que os US$ 8,31 bilhões projetados anteriormente. Em relatório divulgado esta semana, a analista atribuiu a revisão das exportações aos preços mais elevados da soja no mercado internacional.

O preço melhora, mas o cenário para o agricultor continua complicado em 2005, avalia o analista Glauco Carvalho, da MB Associados. A consultoria estima que os preços da soja em grão deverão fechar o ano em média 19% menores do que em 2004. E os custos dos agricultores subiram de 17% a 20% no último plantio. "Será um ano de margens mais estreitas e os agricultores do Sul que tiveram quebra vão enfrentar prejuízos."

Os preços menores projetados para Chicago se explicam pela relação estoques/consumo em termos mundiais. Na safra 2003/04, a relação foi de 18%. Na safra atual, a MB Associados projeta 23%, já considerando que a safra brasileira vai ficar em apenas 54 milhões de toneladas. E Carvalho considera que os preços mais firmes em Chicago este mês poderão convencer os americanos a plantar mais soja do que o inicialmente planejado. "É preciso ver se a intenção de plantio nos EUA não irá crescer, porque isso pode afetar os preços."