Título: Bush nomeia Wolfowitz para o Bird
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2005, Economia, p. B6

Indicação do ideólogo da invasão do Iraque para presidir o Banco Mundial provoca reações negativas na Europa e entre democratas WASHINGTON - Paul Wolfowitz, vice-secretário de Defesa dos Estados Unidos e principal ideólogo da invasão do Iraque, foi nomeado ontem pelo presidente George W. Bush para suceder James Wolfensohn na presidência do Banco Mundial (Bird). Em entrevista coletiva, Bush disse que telefonou a vários líderes mundiais para explicar a escolha do controvertido alto funcionário, que descreveu como "hábil diplomata", "homem decente e com compaixão" e um líder com experiência na administração de grandes organizações. Segundo Bush, essa qualidades habilitam Wolfowitz, de 61 anos, a ser "um forte presidente" do Bird, uma instituição com dezenas de agências e mais de 10 mil funcionários em todo o mundo. Oposicionistas em Washington e governos europeus que se opuseram à guerra do Iraque deixaram clara sua perplexidade. "O entusiasmo na Velha Europa não é exatamente avassalador", afirmou a ministra do Desenvolvimento da Alemanha, Heidemarie Wieczorek-Zeul. O chanceler francês, Michel Bernier, deixou claro o ceticismo de Paris, ao ser indagado por um repórter, à margem de uma reunião da União Européia, em Bruxelas.

"É uma proposta", disse. "Nós a examinaremos no contexto da personalidade que você menciona e talvez à luz de outros candidatos." O diário financeiro alemão Handelsblat foi incisivo. "Para colocar as coisas suavemente, Bush não parece se importar com a reação do resto do mundo, pois muitos verão isso como uma provocação." A reação do jornal alemão refletia provavelmente o fato de a escolha de Wolfowitz ter sido anunciada apenas uma semana após a nomeação do linha duríssima John Bolton a embaixador dos EUA nas Nações Unidas, pessimamente recebida na Europa.

Líderes democratas também criticaram a escolha de Wolfowitz, que acusam de ter feito estimativas exageradas tanto para justificar a invasão do Iraque - aumentando o risco para os EUA do arsenal de armas de destruição em massa de Saddam Hussein, que se revelou inexistente -, como de ter feito projeções muito otimistas sobre o contingente de soldados, a duração da ocupação do Iraque e seu custo ao país. A líder da minoria democrata na Câmara, deputada Nancy Pelosi, disse só entendia a escolha de Wolfowitz como uma decisão de Bush "para removê-lo do Pentágono". "Não vejo que tenha credenciais para a nova posição", declarou.

Matemático com doutorado em Ciência Políticas e Econômicas, Wolfowitz tem um importante currículo acadêmico e de serviços ao governo. Dirigiu a Escola de Estudos Internacionais Avançados da Universidade John Hopkins. Em administrações republicanas passadas, foi secretário de Estado adjunto para Ásia, subsecretário de Defesa para assuntos políticos e embaixador na Indonésia. Nesses postos, como no atual, sua preocupação principal foi sempre a segurança e defesa e não se conhecem suas idéias sobre desenvolvimento econômico - a razão de ser do Banco Mundial - fora do contexto da guerra global antiterrorismo, da qual é um dos principais arquitetos.

Apesar das objeções, Wolfowitz deverá ser eleito para a presidência do Banco Mundial em votação de sua diretoria executiva, que deve ocorrer em duas semanas. Um arranjo de poder que data da criação das instituições financeiras multilaterais, após a 2.ª Guerra, reserva aos EUA a indicação do presidente do Banco Mundial e aos europeus a escolha do diretor do Fundo Monetário Internacional. Cientes disso, Wolfensohn, um australiano naturalizado americano, cujo mandato termina em maio, e o espanhol Rodrigo de Rato, que dirige o FMI, divulgaram ontem declarações elogiosas a Wolfowitz.

A nomeação de Wolfowitz para o Bird ocorre no momento em que sua imagem começa a ser revista por parte da grande imprensa americana à luz das eleições no Iraque e da rebelião anti-síria no Líbano,. Esses fatos são apresentados como provas dos méritos da tese de Wolfowitz sobre o poder de transformação da invasão do Iraque na vida política do Oriente Médio.