Título: Reformas consomem 21 meses da gestão
Autor: Carlos Marchi
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/03/2005, Nacional, p. A4

Dos 26 meses e meio transcorridos desde a posse, o governo Lula só conseguiu administrar sem ser assombrado pelo fantasma das reformas ministeriais durante 5 meses - 19% do seu tempo. Em todas as vezes, quem levantou o tema foi o próprio governo - em geral, o próprio presidente, o chefe da Casa Civil, José Dirceu ou o PT. As duas reformas ministeriais de Lula foram prometidas como amplas e acabaram sendo mini. As duas - em fins de 2003 e fins de 2004 - tiveram elementos muito semelhantes: foram especuladas muito antes da hora, fritaram ministros durante meses, ocuparam várias reuniões de cúpula, em ambas o presidente começou dizendo que não tinha pressa e ao final reconheceu o amargor de demitir 'companheiros'. 'Nunca pensei que seria tão difícil', desabafou Lula em janeiro de 2004.

À época, ele estava próximo do fim da novela da primeira reforma ministerial, dez meses depois da primeira menção à questão, feita, aliás, exatamente por ele, Lula, numa reunião com a cúpula do PMDB, que ele queria atrair para o governo, em março de 2003, apenas dois meses e meio depois da posse.

Daí por diante ninguém parou mais de falar em reforma. Quanto o assunto esfriava, Lula se encarregava de regenerá-lo. Em junho de 2003, no auge dos debates da Reforma da Previdência, ele voltou a prometer ministérios ao PMDB e disse que mudaria ministros em agosto. Enfunaram-se as velas, mas a promessa gorou. Lula garantiu que discutiria a reforma a partir de outubro com os ministros. 'Ninguém saberá da demissão pelos jornais', jurou em setembro. Quatro meses depois o então ministro da Educação, Cristovam Buarque, soube da demissão por telefone. Outros ministros que estavam jurados para a frigideira acabariam não caindo.

DESCOORDENAÇÃO

Aliados do governo advertiram na época que a demora na reforma ministerial provoca uma descoordenação política que traz um risco para o País. Eles reclamavam - e ainda reclamam - que Lula demora muito para tomar decisões e fecha acordos que fulmina no dia seguinte, seja por insistência do PT, ou por pressão de novos aliados. A primeira reforma foi concluída em 23 de janeiro de 2004, dez meses depois de mencionada pela primeira vez pelo presidente. Dois meses e meio depois, no dia 4 de abril de 2004, boatos emanados do Palácio do Planalto insinuavam uma nova reforma para outubro. Em agosto o PT começou a agitar o tema, pensando em garantir o seu espaço.

Repetiu-se o mesmo enredo do ano anterior: reuniões com partidos que o governo queria atrair, o presidente declara que não tem pressa em fazer a reforma, o quadro complica-se, o PT exige mais espaço político, os ministros são fritados, o governo fica paralisado e, por fim, o presidente declara sua angústia em demitir companheiros - a reforma se arrasta.

Agora, quando a segunda reforma ministerial seguiu o exato curso da primeira, aliados do governo levantam dúvidas sobre a capacidade do governo Lula de suportar uma reforma ministerial por ano, ao custo que ela representa.