Título: Com Lula, tarifa subiu 40% mais que o IPCA
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/02/2005, Economia e Negócios, p. B4

Peso dos preços administrados na inflação é maior que nos últimos 2 anos de FHC

Em dois anos de governo Lula, do início de 2003 até o mês passado, os preços administrados subiram 25,37%, quase 40% mais que a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), de 18,29%. O peso desses preços na composição da inflação é maior hoje do que era nos dois últimos anos do governo Fernando Henrique. Sua participação no IPCA saltou de 33,7% para 38,7%, o que reforça as dúvidas do mercado sobre a eficácia da escalada dos juros para frear a inflação. A maior alta foi registrada pelos jogos lotéricos, que subiram 46,62%, seguidos pelo pedágio (44,86%), telefone fixo (36,67%), energia elétrica residencial (34,76%) e água e esgotos (34,15%). Essas altas não se combatem com juros, porque os preços administrados são regidos por um contrato e, na maioria dos casos, são indexados à variação do Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), que por sua vez sofre forte influência do câmbio.

"É um aumento considerável, e uma das razões principais para isso foi o impacto da desvalorização cambial de 2002 sobre os preços administrados", diz o economista Fernando Fenolito, da Rosenberg Consultores Associados, autor do estudo sobre a inflação no governo Lula. Naquele ano, segundo ele, o dólar teve valorização de 52,27% em relação ao real.

A pressão dos preços administrados ainda não acabou, observa o economista Marcelo Allain, professor do curso de MBA da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), da Universidade de São Paulo. Pelos seus cálculos, os preços administrados subiriam 9% neste ano.

Nessas circunstâncias, para atingir a meta de inflação de 5,1% estabelecida pelo governo, os chamados preços livres da economia, que são sensíveis à elevação dos juros, poderiam subir só 3,5% no ano. "A contenção desses preços terá de ser fortíssima para que essa conta bata", afirma Allain.

"Essa política de juros elevados vai nos levar a uma grande fria", diz o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf. Segundo ele, além de desaquecer a economia interna, as altas taxas de juros jogaram o câmbio para muito abaixo do que deveria, prejudicando a balança comercial do País.

"O foco principal a ser atacado é o gasto público, que precisa ser cortado, mas isso é um trabalho de médio e longo prazos. No curtíssimo prazo, o que é preciso é baixar os juros, não aumentar. Os juros altos não têm nenhuma influência nos preços administrados, que já respondem por 40% da inflação", diz Skaf.

O diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida, concorda com Skaf. Na sua avaliação, combater uma inflação que não é de demanda com aumento de juros tem um custo muito alto. "Não vale a pena sacrificar a produção e o emprego", comenta.

Almeida argumenta que o País vive uma inflação de custos, decorrente principalmente das altas nas cadeias petroquímica e siderúrgica. "Além disso, estamos pagando o preço altíssimo de uma privatização inconseqüente, no que diz respeito aos reajustes de preços de serviços públicos previstos nos contratos de venda das estatais." O remédio, segundo ele, seria perseguir uma meta de inflação menos ambiciosa.

O Banco Central tem insistido na elevação do juro básico. Na semana passada, não só aumentou a taxa, pelo sexto mês consecutivo, para 18,75% ao ano, como sinalizou que continuará elevando a Selic em março. O problema é que os resultados desse forte aperto monetário têm sido pífios, principalmente sobre as expectativas do mercado. De setembro para cá, as previsões de inflação para este ano feitas pelo mercado caíram de 6% para 5,3% - uma queda de apenas 0,3 ponto porcentual.

Fernando Fenolito, da Rosenberg, lembra que a maior p arte dos títulos da dívida pública é indexada à Selic. Assim, o aumento da taxa básica acaba elevando a renda dos investidores, ao invés de reduzir, caso a maioria dos títulos fosse prefixada e de prazo mais longo .