Título: Armadilhas das celulares enfurecem clientes
Autor: Renato Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/03/2005, Economia, p. B10

Antes da assinatura do contrato, tudo. As operadoras celulares oferecem aparelhos grátis, planos generosos e financiamentos em até 12 vezes sem juros. Depois, é o inferno. Serviços de má qualidade, contas erradas e maiores que as prometidas pelos anúncios, centrais de atendimento congestionadas e clonagens. Tudo isso acompanhado de um contrato de 12 meses, que, para o cliente escapar, somente pagando multa. A armadilha criada pelas empresas de telefonia móvel tem enfurecido cada vez mais consumidores, o que se reflete nos rankings da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e da Fundação Procon de São Paulo, divulgados recentemente. Amanhã, a Anatel vai divulgar uma nova lista de reclamações contra as empresas. "Até aqui, conseguimos quantidade", afirmou o presidente interino da agência, Elifas Gurgel do Amaral. "Agora chegou a hora da qualidade." Ele explicou que as reclamações registradas contra as operadoras dão origem a processos administrativos, que podem levar à suspensão da venda de novos celulares, até que os problemas existentes sejam resolvidos. A Anatel planeja intensificar a fiscalização e estuda fechar convênios com os Procons, para estar mais próxima dos consumidores.

Cansado de reclamar, o administrador de empresas Felipe Corbett, que mora no Rio, resolveu ir à Justiça contra a Claro. E ganhou. Em fevereiro deste ano, o Juizado Especial Cível condenou a empresa a pagar R$ 520 a Felipe por danos morais e a cancelar uma conta de R$ 150. Os problemas do administrador com a empresa começaram em novembro de 2003, quando mudou seu plano de pré para pós-pago. Ele passou a receber contas com atraso, lançamentos retroativos e cobranças indevidas.

"O pior da Claro é o 0800", afirmou Corbett. "Você espera mais de 40 minutos e, na maioria das vezes, a ligação acaba caindo. Ou o atendente desliga na sua cara. Um verdadeiro suplício." Consultada pelo jornal na sexta-feira, a Claro disse que não teve "tempo hábil nem informações suficientes (CPF e o número da linha do cliente) para verificar o caso".

Muitos clientes ficam ainda mais irritados ao perceber que as empresas fazem investimentos milionários em eventos, enquanto deixam de resolver problemas básicos. A Claro traz ao Brasil artistas como Lenny Kravitz, ao mesmo tempo em que fica em segundo entre as mais reclamadas da Anatel. A Vivo patrocina o festival de cinema Open Air, enquanto corre o risco de ser multada em R$ 1 milhão pelo Procon-SP, por causa de clonagens. A TIM realiza o maior festival de música do País, e está em décimo entre as que menos atendem às reclamações do Procon-SP, incluindo outros setores. Não existe nada de errado em promover eventos culturais e artísticos, é claro. Mas, para os consumidores com problemas, isso parece acontecer em detrimento da prestação de serviços.

A assistente administrativa Ariane Rodrigues até se inscreveu na comunidade "Eu Odeio a Vivo", no site Orkut, de tanto sofrer nas mãos da operadora. Em agosto, ela mudou seu telefone de pré para pós-pago, seduzida por um plano vantajoso, mas foi uma decepção. Apesar de os minutos do pós-pago serem muito mais baratos, seu gasto mensal pulou de R$ 50 para R$ 200: "É um absurdo, pois continuei usando o telefone do mesmo jeito." Na troca de planos, o celular ia demorar 24 horas para ser reabilitado. Levou 15 dias. O problema só foi resolvido quando ela mandou uma carta ao Jornal da Tarde. "Eu falei para a atendente que ia reclamar ao jornal e ela ainda fez piadinha: 'Vou ficar famosa'."

A advogada Débora Debski, cliente da TIM, vê uma diferença muito grande na atitude da operadora antes e depois da assinatura do contrato. "Para angariar clientes, eles correm atrás das pessoas, oferecendo vantagens", disse Débora. "Depois, é como se os clientes deixassem de existir. Não temos a quem recorrer. Além da demora, toda vez que a gente vai fazer uma reclamação, o sistema está indisponível." A advogada recebeu um desconto da TIM quando assinou o contrato, mas ele parou de ser concedido antes do prazo. Ela teve que pagar uma conta maior, para receber o reembolso no próximo mês, depois de muito reclamar. Na sexta-feira, ao saberem que suas clientes haviam falado ao jornal, a Vivo e a TIM foram rápidas em solucionar os problemas.