Título: Real e protecionismo afetam exportação
Autor: Alberto Tamer
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/02/2005, Economia e Negócios, p. B7

Uma semana econômica com sinais positivos e negativos para o Brasil. Na primeira categoria, o depoimento de Alan Greenspan na comissão de bancos do Senado americano. Na segunda, o nítido endurecimento dos Estados Unidos e da União Européia, também, nas negociações comerciais com os países em desenvolvimento, principalmente agroexportadores. Uma conseqüência disso e do real valorizado já pode ser sentida. As exportações brasileiras não aumentaram desde junho do ano passado, como alerta a Trevisan em seu boletim econômico desta semana. Greenspan tranqüilizou o mercado ao afirmar que a economia americana "começou o ano muito bem". Ele estima que o PIB deverá crescer entre 3,75% e 4%, com uma variação de 1,5% ou 1,7%. Mais importante foi o sinal de que o banco central americano deverá manter nos próximos meses o ajuste gradual das taxas de juros. Para Greenspan, a taxa atual de 2,5% "é até baixa..." A manter-se o atual cenário, não haverá nem saltos nem surpresas. E ele não vê mudanças bruscas num horizonte próximo. Em janeiro, os preços dos produtos importados aumentaram 0,9% por causa principalmente da desvalorização do dólar, mas isso não chega a preocupar. A inflação continua sob controle e há ainda mais espaço para desaquecer a demanda, se for necessário. Tudo indica que teremos um primeiro semestre de crescimento nos EUA, abrindo espaço para as exportações brasileiras. Espaço que perdemos no ano passado simplesmente porque, como afirmou o ministro Luiz Fernando Furlan, "não estamos aproveitando o tremendo mercado americano", no qual representamos agora menos de 1%.

NÃO HÁ COMO CONTAR COM ELES

Mas aqui entra a segunda categoria, a de sinais negativos, que surgem tanto nos Estados Unidos quanto na União Européia. E os sinais vieram de Genebra, sede da Organização Mundial do Comércio (OMC), onde o vice-representante de Comércio da Casa Branca, Peter Allgeier, afirmou que o governo americano não fará nenhuma concessão comercial sem uma contrapartida dos países exportadores.

Allgeier foi muito claro e incisivo: o governo americano continuará protegendo seus produtores agrícolas, especificamente de grãos (soja, trigo, milho, etc.). Não haverá cortes de subsídios "de graça". Isto é, os países exportadores, sejam eles quais forem, deverão fazer concessões também em outras áreas: industrial, de serviço, de propriedade intelectual e, acima de tudo, no combate imediato à pirataria. Neste último caso, ele informa que os Estados Unidos deram um prazo ao governo brasileiro até fim de março, antes de agir.

Os dois maiores blocos mundiais, com um PIB somado de US$ 22 trilhões, absorvem 50% das exportações brasileiras, e anunciam que não têm nenhuma intenção de reduzir a proteção de seus mercados internos contra a competição dos países em desenvolvimento, principalmente os agroexportadores. Não só isso. Vão manter subsídios também para as exportações e competir de forma privilegiada com países, como o Brasil, que não têm condições de oferecer as mesmas vantagens. Esta é uma competição antiga que, agora, se intensifica. Por quê? Os Estados Unidos precisam reduzir o enorme déficit comercial e a eurozona, em crise de crescimento, e prejudicada pelo euro forte, precisa proteger seu mercado, seu produtor e exportar para superar a ameaça de caminhar para a recessão. É subsídio agora também para compensar o euro valorizado.

O ACORDO INVIÁVEL

A comunidade vem arrastando as negociações com o Mercosul desde 1999, sempre exigindo mais e oferecendo menos. Não poderia fazer outra coisa, pois não quer e não pode assinar acordo nenhum... A última reunião foi em outubro, e deu em nada. A próxima será em março, em Bruxelas, e tem o mesmo destino, a projetar o que a comissão européia afirma e faz no momento.

Esses sinais de endurecimento deveriam estar preocupando o governo brasileiro porque, neste ano, não poderá contar com um aumento expressivo das exportações ou um aumento do saldo comercial. É grave? Sim. Vamos aos números, que falam por si.

TREVISAN ALERTA

Em seu boletim econômico desta semana, a Trevisan alerta: as exportações mensais brasileiras não aumentam desde junho do ano passado. Em 2004, somaram US$ 96,5 bilhões (32% a mais ante 2003) e as importações, US$ 62,8 bilhões (aumento de 30% sobre 2003). "Se considerarmos a variação mês a mês, desde junho do ano passado não houve crescimento das exportações - ao contrário, o sentido geral é de queda de quase US$ 10 bilhões em junho para cerca de US$ 7 bilhões em janeiro. O saldo da balança comercial também tende a regredir. De um resultado mensal de cerca de US$ 4 bilhões em junho, chegamos a cerca de US$ 2 bilhões em janeiro, mesmo número de fevereiro do ano passado."

Para o economista-chefe da Trevisan, Luiz Guilherme Piva, "a elevação da Selic e a conseqüente desvalorização do dólar, a partir do segundo semestre de 2004, são as principais responsáveis por essa tendência de deterioração no setor externo. O dólar caiu de uma cotação de cerca de R$ 3,00 em junho para cerca de R$ 2,60 em janeiro, em parte pela desvalorização da moeda no mundo, mas, principalmente, pela oferta de divisas via saldos e via recursos atraídos pelos juros reais do Brasil, que vêm subindo no mesmo período."

Piva acrescenta que, "mesmo depois de lições recentes a respeito da combinação perigosa entre juros altos e câmbio valorizado, o governo insiste em usar esses dois mecanismos para tentar atingir a meta (irrealisticamente baixa) de 5,1% de inflação em 2005. Com isso, a vulnerabilidade externa se amplia e expõe a economia brasileira a ataques rápidos e fatais".