Título: Chávez quer comprar mais aviões da Embraer
Autor: Roberto Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/03/2005, Nacional, p. A11

Iniciativa faz parte do programa de reequipamento militar da Venezuela, que preocupa governo norte-americano

A visita do secretário de Defesa Donald Rumsfeld acontece no momento em que o amplo programa de reequipamento militar da Venezuela - uma das principais preocupações da Casa Branca na região - começa a ser executado. Há uma semana foi formalizado o pedido do primeiro lote de 10 helicópteros russos de uma encomenda de 41 unidades de ataque e transporte. A entrega de 100 mil fuzis Ak-47 Kalashnikov começa no primeiro semestre. E, segundo o porta voz do Ministério da Defesa de Caracas, "outras negociações com a Rússia seguem prosperando", uma referência à aquisição de 50 caças MiG-29. A lista de compras de equipamentos de defesa do presidente Hugo Chávez no Brasil também está aumentando. Com grande discrição, o líder venezuelano comunicou ao governo do presidente e amigo Luiz Inácio Lula da Silva que tem interesse em adquirir pelo menos dois tipos de avançados aviões de inteligência fabricados pela Embraer. A combinação dessas aeronaves com os 12 caças bombardeiros AMX-T (4 toneladas de armas, inclusive bombas inteligentes; 1000 km/hora; capacidade de reabastecimento em vôo), encomendados ao mesmo fabricante pela aviação militar venezuelana, é estratégica.

De acordo com as especificações técnicas, os dois modelos de aeronaves podem operar de forma integrada, expandindo significativamente a capacidade de ataque, dispondo de alguma capacidade furtiva. Além do lote de AMX-T, a aviação da Venezuela está negociando 24 turboélices Supertucanos de combate com sistemas de bordo equivalentes aos definidos pela FAB para as aeronaves dessa classe.

O pacote, excluídos os grandes jatos eletrônicos, implica um contrato que pode chegar a US$ 300 milhões, com financiamento pelo BNDES. Chávez quer adquirir as versões ISR (em inglês, inteligência, vigilância e reconhecimento) que utilizam a mesma plataforma do jato civil Emb-145.

Na primeira discussão foram citadas duas configurações. A AEW&C, que utiliza um radar Erieye sueco para cumprir missões de alerta avançado e controle do espaço aéreo; e a AGS, de vigilância da superfície. Essa variante é uma avançada estação de captação de informações - pode fazer escuta e rastreamento de comunicações, além de acompanhar movimentos no solo. De quebra, é um notável sistema de sensoriamento remoto e de levantamento de dados ambientais. Os dois modelos são usados pela Força Aérea Brasileira (FAB) na defesa da Amazônia. A Embraer informa que ambos podem permanecer no ar por oito horas.

O interesse pelos jatos de inteligência cresceu por conta de um susto que a defesa venezuelana tomou há três semanas. No dia 28 de fevereiro, um avião de patrulha marítima registrou a presença de uma grande embarcação da Marinha dos Estados Unidos ao largo da ilha holandesa de Curaçau, no mar do Caribe. Um dia depois o navio estava a apenas 75 quilômetros do litoral da Venezuela. Era o Saipan, 40 mil toneladas de deslocamento, uma unidade de operações anfíbias grande como dois e meio campos de futebol. Leva 2.605 soldados, 1.703 dos quais são marines, os fuzileiros navais americanos, mais 812 tripulantes e 90 integrantes da divisão aérea, formada por helicópteros e aviões de decolagem vertical. Costuma ser usado em operações de assalto.

O comandante naval venezuelano, almirante Armando Laguna, considerou que estava havendo ali "um ensaio de operação clandestina". O porta-voz da embaixada dos EUA, Brian Penn, apressou-se em esclarecer que o Saipan fazia escala de reabastecimento em Curaçau na volta de uma missão humanitária no Haiti. Penn informou que o centro hospitalar de bordo foi utilizado no atendimento à população carente.

O navio partiu no dia 2, sem que fosse atendido um pedido de visita feito pelas autoridades de Caracas. O presidente Chávez convocou uma rede de televisão para creditar o episódio "ao plano americano de lançar uma agressão contra a Venezuela". O ministro da Defesa, Jorge Carnero, destacou a "pertinência do programa de reaparelhamento às Forças Armadas".

Carnero afirmou, em apresentação a senadores e deputados, que "a operação conjunta de aviões de ataque de precisão (os AMX-T) sob controle de um comando aerotransportado (o AEW&C) pode conferir ao país poder de ataque estratégico na região". O ministro quer agora um avião tanque para reabastecimento no ar.