Título: Até carroça leva estudantes à escola
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2005, Vida&, p. A14

Pesquisa em 218 municípios revela que 63% do transporte escolar no Brasil é inadequado e aponta a terceirização como maior risco BRASÍLIA-Crianças em caminhões, motos e até mesmo, às vezes, em carroças. O retrato do transporte escolar no País traçado pela primeira pesquisa feira no Ministério da Educação (MEC) está longe dos tradicionais ônibus escolares e mais próximo dos caminhões com carroceria aberta e bancos improvisados que se vêem em estradas do interior. O levantamento, que analisou a situação de 218 municípios, mostrou que 63% dos veículos que transportam crianças são inadequados. Dentro dessa denominação, de "inadequados", aparecem também aqueles que não seguem todas as normas de segurança previstas pela legislação, como cintos de segurança para todas as crianças nos ônibus e bóias salva-vidas nos barcos.

Mas a maioria mesmo é de veículos que nem mesmo deveriam estar sendo usados para transportar crianças. Há mais veículos listados na categoria "diversos" - que incluem as formas alternativas de transporte -, com 1.979, ou 36,7% do total, do que os ônibus regulares, que são 1.567 e 29,1% dos veículos.

"Nessa categoria aparece de tudo. Caminhões, carros, motos, até mesmo cavalos. Temos caso de um grupo de famílias que juntou dinheiro para comprar um cavalo e uma carroça para as crianças irem para a escola", contou Moisés Domingos Sobrinho, coordenador-geral de Estatísticas Especiais do Instituto de Estatísticas e Pesquisas em Educação (Inep) do MEC, responsável pela pesquisa.

Boa parte dos veículos inadequados não pertence às prefeituras, mas são alugados. A grande maioria, 1.460, são carros de passeio. Aparecem ainda 360 caminhonetes e 79 caminhões, 72 motos e 8 carros de tração animal - as populares carroças.

Os números mostram que 66,7% do transporte alugado é inadequado, enquanto entre os próprios são 33,3%. "Existe uma alta tendência à terceirização, o que é preocupante, especialmente em relação à segurança, a que tipo de veículo está sendo alugado", disse Luiz Silveira Rangel, diretor de Programas e Projetos Educacionais do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). A pesquisa mostrou que justamente nessa terceirização está o maior risco. Boa parte da frota usada, 1.436 veículos, têm mais de sete anos, o que é considerado excesso de tempo para transporte de crianças.

POUCOS

Além dos problemas de qualidade, a pesquisa aponta que os veículos que existem ainda são poucos para atender a necessidade das crianças. Uma estimativa preparada pelo Inep aponta que 23.300 crianças podem não estar indo à escola apenas nos 218 municípios pesquisados porque não há transporte escolar disponível. A maioria delas no Nordeste (55,3%) e no Norte (31,9%) do País. O ensino fundamental, de 5.ª a 8.ª série, seria o nível de ensino em que mais alunos deixam de ir às aulas por falta de transporte.

Os municípios recebem recursos do governo federal através do FNDE para financiarem parte do programa de transporte escolar. No total, são R$ 80,00 por aluno por ano, enviados em nove parcelas. Esse dinheiro pode ser usado para adquirir veículos ou para a manutenção, incluindo o aluguel.