Título: Cem mil festejam fumaça branca
Autor: José Maria Mayrink
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2005, Especial, p. H2

Com bandeiras de países de todo o mundo, fiéis eufóricos se abraçaram quando a decisão foi sinalizada na chaminé da Capela Sistina Euforia, abraços e música. Foi dessa forma que os fiéis celebraram ontem o anúncio do novo papa. "É branca, é branca", diziam perplexos vários grupos que observavam a fumaça branca que saía da chaminé instalada no telhado da Capela Sistina e significava o fim dos processo de eleição. A polícia italiana estimou, no inicio da noite, que mais de 100 mil pessoas estavam no local quando foi feito o anúncio do nome do papa. Mas, durante alguns minutos após o início da liberação da fumaça branca, a dúvida se a eleição havia sido decidida ou não ainda permanecia. Pessoas corriam de um lado a outro, ligavam para amigos ou tentavam obter informações de jornalistas. Um dos motivos da incerteza foi que os sinos da Basílica de São Pedro não badalavam como havia sido previsto pelo Vaticano caso a fumaça branca fosse identificada. Mas, quando os sinos começaram a se movimentar para iniciar uma insistente badalada, os fiéis se abraçavam, gritavam de alegria e batiam palmas.

"Habemus papam, Habemus papam (Temos papa, temos papa)", repetiam os fiéis, carregando bandeiras de todos os cantos do mundo. O público ainda precisou esperar por quase uma hora para saber a identidade do papa. Foi o tempo para que uma verdadeira multidão chegasse à praça. Na região próxima ao Vaticano, uma verdadeira corrida foi vista. Todos tentavam chegar o mais rápido possível à Praça de São Pedro. Um deles era o padre brasileiro Antonio Keller, que estava em uma loja quando viu pela televisão a fumaça branca. "Não conseguia achar um ônibus e acabei tomando um táxi que já estava cheio, mas aceitou me dar uma carona", conta.

Um forte esquema de segurança foi logo posto em ação pela polícia, que se movimentava freneticamente pela praça e pelas ruas que dão acesso ao local. Para tentar evitar problemas, os policiais fecharam as ruas que davam acesso ao Vaticano e permitiam que apenas pedestres caminhassem em direção à Praça São Pedro.

Quando o nome do novo papa foi finalmente anunciado, o local já estava completamente tomado. Mais uma vez, os fiéis deram demonstrações de alegria ao ouvir o nome de Joseph Ratzinger, embora com menor ênfase do que a própria constatação feita anteriormente de que a fumaça que saía da chaminé era de fato branca.

Ainda assim, a festa dos papaboys, jovens católicos que marcaram os dias que se seguiram à morte de João Paulo II, voltou a tomar conta da Praça de São Pedro. Alguns grupos entraram pela noite cantando músicas religiosas, orando e até dançando. "Bendito por Deus", gritava um grupo de religiosos brasileiros que carregava uma enorme bandeira do País e dançava pela praça. "Viva o papa", diziam grupos de hondurenhos, que estavam na praça esperando que um cardeal de seu país fosse eleito.

"Estamos muito felizes", afirmou o estudante alemão Christian Baron. Para outro alemão, Johannes Demmer, Bento XVI "tem tudo para ser um grande papa".

Mas, mesmo diante da celebração pela eleição do novo papa, vários jovens não escondiam a preocupação com o conteúdo "conservador" de Bento XVI. Para a terapeuta alemã Annette Haegele, Ratzinger é "conservador demais para conquistar os jovens". Margarida, uma brasileira, também concorda com a avaliação e acredita que seu conservadorismo pode ser um obstáculo ao seu pontificado.

Os brasileiros, inúmeros na praça com suas bandeiras, não escondiam que torciam pela eleição de um cardeal do País, possivelmente d. Cláudio Hummes. "Ratzinger vai representar um continente. A Igreja precisava de outra coisa para poder mudar", afirmou Fernando Peterossi, de Monte Alto.

Já Eduardo Velloso, da região do ABC paulista, torcia para que um brasileiro fosse eleito, mas acredita que o importante seja ter um papa que corresponda às necessidades da Igreja. "O país de onde ele vem não importa. Vamos apoiá-lo", disse outro religioso brasileiro de Aracaju, que preferiu não ser identificado.

Alguns italianos, esperançosos de que o pontificado voltasse ao país depois de 26 anos com um polonês, estavam entre os mais desapontados pelo anúncio de que o novo papa seria um alemão. "Queria sinceramente que o papado fosse dado a um italiano. Isso ajudaria muito o país a voltar a refletir sobre sua espiritualidade", disse Angelo, um engenheiro de Roma.

Um grupo de fiéis libaneses preferiu ter esperanças de que, como papa, Ratzinger mude sua atitude e, principalmente, continue a dar atenção ao processo de paz no Oriente Médio. "João Paulo II foi fundamental no diálogo entre o Ocidente e os países árabes. Esperamos que isso continue com o novo papa", afirmou Sam Khouri.

Se o anúncio do novo papa provocou uma correria até a Praça de São Pedro, a saída das pessoas após conhecer quem seria o líder da Igreja também foi marcado por um certa confusão.

A região próxima ao Vaticano ficou completamente congestionada e as estações de metrô estavam lotadas.