Título: Aumenta o crédito. E também o juro
Autor: Gustavo Freire
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/03/2005, Economia, p. B3

Em fevereiro, volume de empréstimos cresce 3,9% sobre o mês anterior. E taxa média cobrada ao consumidor é a mais alta em 1 ano

BRASÍLIA - Despesas com compra de material escolar, pagamento de matrícula e de impostos como o IPTU e o IPVA levaram os consumidores a aumentar a procura por empréstimos neste início de ano. Em fevereiro, o total emprestado às pessoas físicas chegou a R$ 120,8 bilhões, um crescimento de 3,2% sobre janeiro. Nos primeiros dias de março, o aumento já era de 2,1%. Isso apesar de as taxas de juros média sobre operações de crédito terem atingido, em fevereiro, a marca de 64% ao ano, a mais alta desde fevereiro de 2004. É o que mostra levantamento divulgado ontem pelo Banco Central. Os empréstimos com desconto em folha e aqueles concedidos aos aposentados ajudaram a aumentar o bolo do crédito, somando R$ 13,6 bilhões. Mas, nesses empréstimos, a taxa de juros é mais baixa: 39,4% ao ano, contra 75,3% cobrados nos demais empréstimos bancários às pessoas físicas.

A maior procura por empréstimos, tendência que se mantém há meses, estimulou os bancos a tentarem aumentar seu lucro. "Podemos observar isto claramente pelo comportamento do spread bancário (diferencial entre as taxas de captação de recursos de terceiros e as cobradas nos empréstimos)", disse o chefe do Departamento Econômico (Depec) do BC, Altamir Lopes. O diferencial de taxas, segundo ele, vinha apresentando uma tendência clara de queda desde o início de 2004 até julho, quando começou numa trajetória de alta, interrompida em dezembro.

O volume de empréstimos em consignação (com desconto em folha e para aposentados) faz com que as sucessivas altas de juros feitas tenham impacto menor sobre o custo dos empréstimos bancários do que já se verificou no passado. "O segredo é que há hoje maior mobilidade das pessoas entre diferentes modalidades de crédito do que no passado."

Lopes destacou, em especial, o incremento dos empréstimos com desconto em folha feitos por aposentados do INSS. Depois de fechar fevereiro em R$ 3,570 bilhões, estas operações já haviam alcançado a marca dos R$ 4,254 bilhões na parcial de março.

Esses empréstimos são apontados por analistas como um mecanismo que vai na direção contrária da pretendida pelo BC ao elevar os juros: conter o consumo. Economistas acham que essa contradição tem obrigado o BC a ser ainda mais rigoroso com os juros.

Outra conseqüência desses empréstimos é dificultar a queda no custo das operações de crédito. De acordo com o BC, a alta dos juros em fevereiro deverá continuar em março. Os dados dos primeiros nove dias úteis de março, indicaram que a tendência de encarecimento do crédito ainda não havia se esgotado. Pelos números parciais, as taxa de juros cobrada dos consumidores já teria batido nos 64,2% de fevereiro de 2004, ficando, com isso, abaixo só dos 65,4% de janeiro de 2004. "Esses são dados preliminares. Não é possível dizer ainda se esta tendência será mantida até o fim do mês. Temos de aguardar."

Apesar desse crescimento nos empréstimos, Lopes avaliou que o ritmo de aumento da oferta de empréstimos já mostra sinais de acomodação. "No início do processo de retomada do crescimento econômico, já tivemos taxas mais elevadas de expansão do crédito", disse ao explicar que a mudança é um reflexo direto do aperto monetário iniciado em setembro. Os sinais de acomodação devem ficar mais claros a partir de abril. "Em março, ainda temos o efeito do aumento do crédito provocado pela necessidade das pessoas de obterem os recursos para o pagamento de tributos e despesas escolares."