Título: Investimentos, só com mais aperto
Autor: Sheila D'Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/03/2005, Economia, p. B3

O governo poderá aumentar o aperto fiscal este ano para compensar o efeito que os novos investimentos em projetos de infra-estrutura terão sobre a inflação. Segundo o diretor de Política Econômica do Banco Central, Afonso Beviláqua, o impacto desses gastos nos índices de preços dependerá da magnitude do aperto fiscal que será efetivamente realizado ao longo de 2005. Apesar de o chamado superávit primário (diferença entre receitas e despesas do setor público, sem incluir o pagamento de juros) estar fixado em 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, o diretor ressaltou que, nos últimos anos, o que se verificou foram valores sempre maiores do que as metas oficiais. Com isso, ele indicou que, mesmo que o governo não aumente a meta para 2005, poderá conter as despesas mais fortemente para evitar impactos inflacionários.

"Se olharmos para os dados dos últimos três ou quatro anos, a execução fiscal tem sido de tal forma que o superávit primário tem ficado sempre acima das metas programadas." A tese de elevação do superávit primário em 2005 ganhou força com a decisão do governo brasileiro de não renovar o acordo de ajuda financeira com o Fundo Monetário Internacional (FMI). "O acordo foi feito em 2003 para ser preventivo. A intenção era usá-lo para o Brasil poder sair do FMI", disse Beviláqua, negando que tenha havido precipitação do governo ao tomar essa decisão.

Na avaliação de especialistas, o aumento do aperto fiscal este ano enterraria interpretações de que, agora, há mais espaço para gastança no setor público. Além disso, confirmaria o compromisso da equipe econômica com o equilíbrio das contas públicas, num momento em que o País poderá excluir despesas para financiar obras de infra-estrutura do cálculo do superávit primário.

Nos próximos três anos, o governo brasileiro poderá gastar cerca de R$ 3 bilhões em projetos de infra-estrutura com retorno econômico para o País e abater esse valor do cálculo final do superávit primário. Com isso, a meta de 4,25% do PIB deste ano cairia para 4,1%. A elevação dos gastos públicos tem efeito sobre a economia, ainda mais num período de retomada do crescimento em que o BC se diz preocupado com a demanda por bens e serviços. Por isso, especialistas de mercado vêm alertando sobre o impacto dessas despesas na inflação.

Em 2004, o superávit primário do setor público estava fixado em 4,25% do PIB, o governo elevou esse porcentual no fim do ano para 4,5% do PIB e encerrou dezembro com uma economia ainda maior, de 4,61%. A redução desse nível em 2005, segundo os economistas, já está tendo conseqüências para inflação.

Questionado se o BC contava com um aperto maior para conseguir fazer a inflação convergir para os 5,1% determinados como alvo para este ano, Beviláqua se limitou a comentar que leva em conta "o superávit de 4,25% do PIB e a redução progressiva da relação da dívida pública com o PIB". O diretor, porém, se esquivou de explicar se nesses 4,25% do PIB estão incluídos ou não os gastos em infra-estrutura.

RESERVAS

O fim do acordo com o FMI, de acordo com o diretor, não mudará em nada a política do Banco Central de recomposição das reservas internacionais do País, uma espécie de poupança pública para honrar compromissos externos. Segundo Beviláqua, ela continuará pautada pelas condições do mercado, de forma a não adicionar volatilidade nem influenciar a taxa de câmbio.