Título: Condoleezza visita Brasil de olho em Cuba e Venezuela
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2005, Nacional, p. A4

A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, chega hoje a Brasília para visita em que Brasil e Estados Unidos terão uma agenda delicada, que realça discordâncias sobre importantes questões regionais e globais Nas regionais são problemas a proximidade do Brasil com Venezuela e Cuba e as diferenças a respeito da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Nos temas globais o desencontro é a polêmica reforma do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). A vinda de Condoleezza lhe dará elementos necessários para confirmar ou não a visita do presidente George W. Bush ao País, prevista para novembro. A viagem foi acertada em janeiro, quando ela e o chanceler Celso Amorim combinaram, por telefone, uma troca de visitas, sem marcar datas. O convite para vir ao País foi reiterado na visita que o ministro José Dirceu (Casa Civil) lhe fez há dois meses.

Apesar dos avanços na órbita bilateral desde o primeiro encontro entre Bush e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em junho de 2003, os descompassos nos temas regionais e globais aumentaram no último ano e meio. Nos encontros que terá com Lula e Amorim, Condoleezza deve repassá-los um a um, mesmo que não pertençam à sua esfera de ação, como a Alca.

A apenas 14 dias da reunião de cúpula da América do Sul e dos Países Árabes, em Brasília, Condoleezza deve ouvir que o evento estará voltado para temas econômicos e comerciais. O governo garantirá que, apesar de ter um natural componente político, o encontro não vai produzir declarações críticas contra Israel e a política americana para o Oriente Médio.

O governo deve reclamar, do seu lado, que os países desenvolvidos não tiveram interesse nos problemas do Haiti e empurraram para o Brasil a liderança das tropas da ONU. Outro ponto delicado da conversa é a pretensão brasileira de um assento permanente no Conselho de Segurança. Em março, em visita a Tóquio, Condoleezza anunciou apoio ao Japão; poucos dias depois, no Brasil, o secretário de Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, desconversou, dizendo que Bush não decidira a respeito.

DIRCEU VISITA CARACAS

Condoleezza deve se queixar da interferência "nociva" do presidente Hugo Chávez, da Venezuela, nas frágeis democracias da região e da sua política interna autoritária. Apesar do continuado respaldo de Lula a Chávez, os EUA reconhecem sua influência moderadora sobre Caracas, mas querem que o governo endureça sua posição. Ontem à tarde, Dirceu embarcou para Caracas, para um encontro pedido por Chávez há alguns dias. Ele voltaria hoje de madrugada, para estar em Brasília no encontro de Lula com Condoleezza, previsto para às 18 horas.

No encontro, a secretária deve criticar também a proximidade do governo Lula com Cuba. Em sua comitiva virá o secretário-adjunto de Estado para Assuntos do Hemisfério Ocidental, Roger Noriega, ácido crítico do regime cubano. O governo está pronto a declarar que não pretende mudar sua posição favorável ao aprofundamento das relações com Havana e contrária ao embargo americano.

Na área bilateral, os grupos criados para discutir cooperação avançam bem, segundo o Itamaraty. Mas as hordas de brasileiros que tentam ingressar ilegalmente nos EUA criam um problema continuado na área consular. Em Monterrey (México), Lula propôs a Bush eliminar o visto recíproco para brasileiros e americanos. Bush prometeu estudar a proposta. Agora, a captura de 232 brasileiros ilegais em solo americano poucos dias antes da chegada de Condoleezza é um sinal de que a proposta brasileira continuará engavetada