Título: Célula do cérebro produz insulina
Autor: Cristina Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2005, Vida&, p. A12

O trabalho foi realizado com células-tronco de camundongos; os pesquisadores acreditam em tratamento no futuro Um pequeno grupo de pesquisadores da Universidade Stanford, na Califórnia (EUA), transformou células-tronco retiradas do cérebro em produtoras de insulina, resultado que pode abrir caminho para novos tratamentos da diabete tipo 1. O trabalho é detalhado hoje na revista eletrônica especializada PLoS Medicine (www.plosmedicine.org), de livre acesso aos internautas. Células-tronco são encontradas em diversas partes do corpo, como medula óssea, sangue e cérebro, e têm a capacidade virtual de formar qualquer tipo de tecido do corpo humano.

A equipe, liderada pelo biólogo molecular Seung K. Kim, retirou as células-tronco neurais de camundongos e as tratou em laboratório com substâncias químicas para direcionar sua diferenciação. Depois de alguns erros e acertos, eles encontraram a quantidade certa que permite a maturação das células em pequenas "máquinas" secretoras de insulina.

Eles então as implantaram no fígado de camundongos. Estimuladas por açúcares, as células liberaram o hormônio, ainda que em uma quantidade abaixo do normal por não produzirem todas as proteínas esperadas. Contudo, a produção da insulina não foi interrompida durante quatro semanas nem foram observadas modificações de outras células do órgão ou a formação de tumores.

A mesma equipe havia testado a técnica com células-tronco retiradas de embriões, que em teoria têm uma maior capacidade de se transformar. Contudo, Kim resolveu experimentar outros tipos, como as neurais, pela dificuldade de se trabalhar com a variação embrionária nos Estados Unidos: a administração Bush veta o financiamento de tais pesquisas. Além disso, as linhagens disponíveis para cientistas no país estão contaminadas, o que inviabiliza o transplante em humanos. Células-tronco embrionárias também são mais difíceis de ser dirigidas para formar o tecido que o cientista busca.

O pesquisador afirma que as células neurais têm características que lembram as ilhotas de Langerhans: como os neurônios, as ilhotas respondem a sinais externos para mudar suas propriedades e liberar um grupo de proteínas - no caso, a insulina. Em animais menos complexos, como drosófilas, são os neurônios que produzem a insulina e regulam a taxa de açúcar no organismo, como Kim demonstrou em outro estudo publicado na revista Science.

"Há um interesse freqüente em desenvolver estratégias de substituição de tecidos para o tratamento de doenças como a diabete mellitus e o mal de Parkinson. Enquanto muita atenção é focada na promessa de células-tronco embrionárias para a substituição de tecidos, trabalhos recentes sugerem que células-tronco neurais pode ter um grande potencial de diferenciação extraordinária", escreve o biólogo.

Outra técnica para tratar diabéticos que tem obtido sucesso nos testes é o transplante de ilhotas retiradas de doadores mortos. Para Kim, as pesquisas não se anulam. "O avanço de terapias baseadas no transplante e a carência de ilhotas pancreáticas de Langerhans focaliza o interesse em novas fontes renováveis."

Na diabete tipo 1, o pâncreas é incapaz de produzir a insulina, hormônio que regula a quantidade de açúcar no sangue, o que força o paciente a ser dependente de injeções da substância. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 150 milhões de pessoas no mundo sofrem com a doença, especialmente crianças e adolescente; até 2025, o número pode dobrar.