Título: Bento XVI rezou para não ser eleito
Autor: José Maria Mayrink
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2005, Vida&, p. A14

Durante audiência a cerca de 5 mil alemães, papa disse ter pedido a Deus para escolher alguém mais forte e poupá-lo desse destino O papa Bento XVI revelou ontem, durante uma audiência para cerca de 5 mil peregrinos alemães, que durante o conclave rezou para não ser eleito, pedindo a Deus que escolhesse alguém mais forte do que ele. "Evidentemente, nesta situação, o Senhor não me escutou", comentou, entre aplausos e vivas a seu nome. Antes de iniciar a saudação a seus compatriotas, o papa se justificou por ter chegado 20 minutos após a hora prevista, que seria às 11h30 (6h30 no Brasil). "Desculpo-me pelo atraso, pois parece que os alemães são famosos por sua pontualidade, mas eu já me italianizei." Joseph Ratzinger disse que, ao revelar alguma coisa sobre a eleição, não estava quebrando o segredo do conclave. E então falou o que lhe custou a escolha de seu nome. "Não pensei jamais em ser eleito e nada fiz para que isso acontecesse. Mas, quando vi que esta guilhotina se aproximava em minha direção, pedi a Deus que me poupasse esse destino."

Os alemães que ocupavam mais da metade do moderno auditório Paulo VI, no Vaticano, começaram gritando o nome do papa em italiano - Benedetto - mas logo traduziram para a sua língua - Benedikt! Viva Papst! O discurso durou 20 minutos, em alemão. A sala de imprensa da Santa Sé distribuiu o texto apenas no original.

O papa entrou no auditório às 11h50 pelo corredor central. Levou três minutos para chegar até o palco, porque dezenas de pessoas fizeram questão de apertar suas mãos. Bento XVI ia andando e sorrindo, mas algumas vezes respondeu àqueles que lhe falavam. Parou para abençoar duas crianças.

Junto à cátedra de onde faria seu discurso, esperavam pelo papa 2 cardeais e cerca de 50 bispos e sacerdotes, entre eles o seu irmão, padre Georg Ratzinger, de 81 anos, que veio da Alemanha para assistir à missa de domingo. Os bispos, padres e alguns leigos, homens e mulheres, fizeram uma fila para beijar a mão de Bento XVI, que os recebeu de pé, conversando quase um minuto com cada um.

Foi um encontro mais descontraído que a audiência de sábado, quando recebeu, por apenas 15 minutos, cerca de 1.800 jornalistas credenciados para a cobertura do conclave e da cerimônia de inauguração do pontificado. A audiência de ontem durou 40 minutos.

O atraso na chegada explicava-se, segundo o Serviço de Informação do Vaticano, porque o papa vinha de outra audiência, na Sala Clementina, do outro lado da Basílica de São Pedro, onde recebeu delegações de outras igrejas e comunidades cristãs e de outras religiões não cristãs.

Nessa reunião, Bento XVI fez votos para que todos os cristãos cheguem a uma plena comunhão, tornando sua a oração que Cristo fez pelos primeiros discípulos - ut unum sint, que todos sejam um. O papa disse que, fiel ao compromisso assumido pelo Concílio Vaticano II, lutará pela união dos cristãos.

"Vossa presença, caros irmãos em Cristo, ultrapassando o que nos divide e lança sombras em nossa comunhão plena e visível, é um sinal de partilha e de apoio para o bispo de Roma, que pode contar convosco para perseverar no caminho da esperança e para crescer em direção àquele que é a cabeça, Cristo".

Bento XVI dirigiu-se em seguida aos muçulmanos, que não citou na homilia de domingo, quando se referiu aos cristãos separados de Roma e aos judeus. "Sou particularmente grato pela presença entre nós de membros da comunidade islâmica e manifesto minha satisfação pelo avanço do diálogo entre muçulmanos e cristãos, tanto no nível local como no internacional." O papa assegurou que a Igreja católica quer continuar construindo pontes de amizade com os seguidores de outras religiões, a fim de buscar o verdadeiro bem de cada pessoa e de toda a sociedade.