Título: Algo novo nas exportações
Autor: CELSO MING
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2005, Economia, p. B2

Ao longo deste ano, o dólar caiu 4,3% em relação ao real e continua descendo a ladeira, cenário, em princípio, devastador para as exportações que adoram moeda nacional desvalorizada. E, no entanto, as exportações nunca foram tão bem.

Os resultados dos primeiros 22 dias de abril impressionam. Neste ano, estão 28,4% mais altas do que no mesmo período do ano passado e o saldo comercial (superávit) saltou 48,6%. As exportações de manufaturados - em tese, mais sensíveis a atrasos cambiais - estão crescendo 30,2%, no critério de média por dia útil.

Curiosamente, as importações, que deveriam ser encorajadas por um dólar mais barato em reais, avançam apenas 19,2%.

Os economistas estão à cata de explicações. Alguns sugerem que se trata de resultado enganoso, que apenas reflete o fechamento de contratos antigos que não serão renovados.

Outros dizem que bom número de manufaturados exportados incorpora conjuntos importados. Assim, parte do custo de produção estaria caindo com o recuo da cotação do dólar, ajudando a manter a competitividade do produto nacional. É o caso dos aviões da Embraer que levam cerca de 85% de componentes importados.

Outros lembram que as receitas dos exportadores não provêm só do câmbio, mas também dos juros generosos obtidos com a aplicação financeira do resultado da Antecipação de Contratos de Câmbio (ACC). Nesse sentido, juros altos também estariam favorecendo os exportadores.

Há ainda a afirmação de que os exportadores têm conseguido reajustar seus preços junto a seus clientes sob o argumento de que as matérias-primas estão mais caras em dólares.

São hipóteses que têm lá sua força, mas não explicam tudo. O economista Edward Amadeo, ex-ministro do Trabalho no governo Fernando Henrique Cardoso, hoje na Tendências Consultoria, observa que a quantidade exportada cresceu bem mais do que a quantidade importada e substancialmente mais do que a quantidade produzida no País. E conclui que está havendo mudança estrutural, cujo resultado é levar o fluxo de mercadorias a depender menos do câmbio interno.

Há alguns anos, o produtor brasileiro preferia vender no mercado interno (onde supostamente conseguia melhores preços) e embarcava apenas o encalhe, o "excedente exportável". Hoje, no entanto, ele confia mais no mercado externo, pois o crescimento da economia mundial é maior do que o do Brasil e porque "a volatilidade da demanda externa é menor do que a da doméstica".

Em outras palavras, a globalização empurrou as grandes empresas brasileiras a serem prioritariamente supridoras do comércio mundial e apenas secundariamente do comércio doméstico. "As empresas estão no Brasil não apenas porque o mercado interno é grande, mas porque há vantagens locacionais - acesso a matérias-primas, custo e qualificação da mão-de-obra, vantagens fiscais, etc. Mesmo empresas que já estavam no País na década de 1980 reestruturam-se para globalizar suas compras de insumos e suas vendas."

Dois outros dados confirmam que exportação é negócio de empresa grande. Primeiro, a OMC verificou que cerca de dois terços do fluxo comercial do mundo são realizados entre uma fornecedora multinacional e um cliente multinacional; ou tem uma multinacional em uma das duas pontas. O outro dado é de que 89,5% das exportações brasileiras de 2003 foram realizadas por 21,3% das empresas, todas elas consideradas grandes empresas (dados da Secretaria de Comércio Exterior, do Ministério do Desenvolvimento).

Além disso, lembra Amadeo, não é só comércio. Conta, também, o fato de que o comércio amplia o acesso ao financiamento externo, a juros muito mais baixos do que os brasileiros.

Enfim, é mais um elemento que pode explicar por que as exportações continuam um sucesso mesmo com um dólar fraco diante do real.