Título: João Paulo II começa a receber alimentação através de sonda
Autor: Adriana Dias Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2005, Vida &, p. A22

O papa João Paulo II passou a se alimentar desde ontem por meio de uma sonda. Ele foi submetido a um procedimento médico para a implantação de uma sonda nasogástrica, que deve facilitar a sua ingestão de alimentos. O tubo vai do nariz ao estômago e ajudará o papa na deglutição da comida, dada a dificuldade que os doentes de Parkinson, como ele, tem para fazê-lo. A informação foi dada pelo porta-voz da Santa Sé, Joaquín Navarro Valls, em comunicado, logo após João Paulo II aparecer, pela manhã, à sua janela na Praça de São Pedro. A aparição durou quatro minutos, durante os quais o papa tentou falar com os fiéis, mas sem conseguir. Ele tinha aspecto frágil e fazia gestos contidos, além de ter aberto a boca várias vezes para respirar. A implantação da sonda ocorreu logo depois de o papa se recolher.

De acordo com Valls, o objetivo da sonda nasogástrica, que leva os alimentos diretamente ao estômago, é "melhorar a ingestão calórica e ajudar na efetiva recuperação de forças" do papa. Segundo os médicos, a implantação de uma sonda para alimentação é um procedimento usual para pessoas que requerem nutrição suplementar e não precisa ser feito em hospital.

Para o pneumologista Elie Fiss, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, e professor da Faculdade de Medicina do ABC, a mais provável causa do tubo é a doença neurológica degenerativa do papa. "Por isso, é difícil ele um dia voltar a se alimentar sem a sonda", disse.

O pneumologista se refere ao mal de Parkinson, doença da qual sofre o papa. Entre as principais características, esse mal enrijece a musculatura e descoordena os movimentos do corpo. "A necessidade da sonda mostra o avanço natural da doença e que as coisas não estão bem", avaliou Fiss.

A sonda nasogástrica como a que foi posta em João Paulo II é um tubo de plástico que entra pelo nariz, passa pela garganta e desce até o estômago. Através dela são ministrados alimentos líquidos. Embora incomode o paciente, sua colocação não requer anestesia nem cirurgia.

A sonda é fixada no nariz com esparadrapo e sua posição costuma ser alterada diariamente com um leve movimento de rotação. Para fazer os alimentos chegarem ao estômago, seu conteúdo é aspirado inicialmente e, em seguida, os nutrientes são introduzidos de forma lenta (durante 15 minutos aproximadamente).

A substituição da sonda varia conforme o material de que é feita. Se for de polietileno, pode ficar implantada por até duas semanas; se for de poliuretano, até três meses; e, se for de silicone, até seis meses. Além da nutrição, a sonda pode ser utilizada também para lavagens estomacais.

A DEFINITIVA

No caso do papa, alguns especialistas acreditam que a sonda implantada ontem pode preceder uma definitiva. É o caso do neurologista Gianni Pezzoli, presidente da Associação Italiana para o Mal de Parkinson. "A inserção de uma sonda nasogástrica para melhorar a alimentação habitualmente precede a aplicação de uma gastrostomia percutânea endoscópica (PEG, na sigla em inglês)", disse. "Trata-se de uma sonda de 1 centímetro de diâmetro colocada na parede abdominal para injetar alimentos."

Pezzoli afirmou também que é preciso ver como o papa vai reagir à sonda temporária. "É preciso levar em conta que, após algumas semanas, a sonda tende a criar problemas e úlceras nos lugares onde se dobra, no esôfago e no estômago", explicou. "Por isso, ela é retirada e substituída por uma definitiva." Segundo Pezzoli, uma vez resolvido o problema da alimentação, não está descartada a retirada da cânula implantada por traqueostomia, realizada em 24 de fevereiro, para que João Paulo II possa recuperar a fala.

NA POLTRONA

Apesar da sonda, na nota de ontem, Valls disse que João Paulo II "continua sua lenta e progressiva recuperação" e "passa muitas horas do dia em uma poltrona, participa missa em sua capela particular e tem contato de trabalho com seus colaboradores, acompanhando diretamente a atividade da Santa Sé e a vida da Igreja".

O porta-voz confirmou que as atividades públicas do papa permanecem suspensas e acrescentou que o acompanhamento médico vem sendo feito pelo serviço de saúde da Cidade do Vaticano, dirigido por médico pessoal de João Paulo II, Renato Buzzonetti.

Fontes médicas atribuem a Buzzonetti a decisão de fazer o papa usar essa sonda temporária com a esperança de que ele possa se recuperar e passar a se alimentar normalmente. A equipe da Policlínica Gemelli, no entanto, é a favor da sonda permanente. v