Título: Severino volta a atacar excesso de MPs e diz que Lula precisa 'ouvir melhor'
Autor: Eugênia Lopes, João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/04/2005, Nacional, p. A4

O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), voltou ontem a falar grosso com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele reafirmou que vai fazer de tudo para que Lula reduza a edição de medidas provisórias, mas, dessa vez, num tom bem mais elevado. "Vamos continuar pedindo, até ele ouvir melhor", disse Severino. "Talvez ele (Lula) não esteja ouvindo muito bem esses apelos." No início do mês, Severino chegou a dar uma espécie de ultimato a Lula ao exigir a nomeação do deputado Ciro Nogueira (PP-PI) para o Ministério das Comunicações, sob ameaça de alinhar-se com a oposição. Por causa disso, Lula excluiu o PP da reforma ministerial. Agora, Severino cobra posição em relação às MPs, às vésperas de embarcar ao lado de Lula para acompanhar o enterro do Papa João Paulo II, no Vaticano.

Severino lembrou que no caso da MP 232 - que corrigia a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) em 10% e aumentava o imposto dos prestadores de serviço - Lula ouviu a sociedade e recuou. Severino foi um dos principais articuladores da derrota da MP. O Planalto só concordou em abrir mão do aumento dos impostos quando percebeu que, se insistisse, perderia em plenário.

Na terça-feira, Severino pediu à Secretaria-Geral da Mesa que examinasse a possibilidade de devolver as MPs que ele considerasse irrelevantes e sem urgência, com base no poder regimental que tem e lhe permite mandar de volta projetos de lei que julgar incabíveis.

Ele prometeu, porém, não tomar decisão precipitada. "Vou aguardar a análise que está sendo feita pelos especialistas. Não vou tomar nenhuma medida açodada. Tudo o que fizer vai ter respaldo jurídico." Como viaja hoje para Roma, Severino disse que só vai tomar uma decisão na semana que vem, quando retornar ao País.

"ERRO GRAVE"

O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), respondeu à possibilidade de devolução de MPs. "O Severino imaginar que o presidente da República não tem sensibilidade... A insensibilidade está em quem deu essa declaração. Se alguém disse isso, cometeu um erro grave", reagiu.

Chinaglia não é unanimidade entre os governistas. O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) acha que Severino tem razão por lutar contra a edição exagerada de medidas provisórias. "Tem muitas MPs que não são urgentes nem relevantes. Está muito certo de ficar irritado."

João Paulo acha que a direção da Câmara e os líderes têm de encontrar um caminho para novas formas de tramitação das MPs. Atualmente, uma comissão de senadores e deputados examina o que fazer com elas. Há, por exemplo, uma forte tendência de se proibir a edição de medida provisória sobre matéria tributária.

Para o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, a preocupação de Severino tem sentido, mas ele acha que o presidente da Câmara não pode devolver as MPs. "A Constituição assegura ao presidente a prerrogativa de emitir medidas provisórias e ao Congresso julgar a urgência e relevância. Não cabe a Severino julgar isso", disse. "Além disso, o governo Lula edita MPs em número inferior ao dos governos anteriores."

CCJ

Entre os negociadores do governo, a idéia é fazer com que a decisão sobre a relevância ou urgências seja decidida pela Comissão de Constituição e Justiça. É o que acha, por exemplo, o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP). Já o líder do PSB, Renato Casagrande (ES), diz que a única forma de disciplinar a edição de MPs é promover mudanças nos regimentos da Câmara e do Senado. Para ele, Severino blefa, porque "não tem poder de devolver MPs."