Título: Para aliados, fracasso da MP é maior derrota de Lula
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/04/2005, Nacional, p. A6

O fracasso da Medida Provisória 232, que corrigiu a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) em 10% mas aumentou demais o imposto dos prestadores de serviço, já é contada como a maior derrota do governo de Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso nestes dois anos e três de administração petista. No Palácio do Planalto, entre ministros e líderes aliados, a encrenca toda é tida como conseqüência de uma grande fratura que existe hoje dentro do governo. Isso acabou por contaminar a base aliada. Dentro do governo, o ministro José Dirceu se sente enfraquecido e desprestigiado por não ter emplacado as mudanças que pretendia na reforma ministerial. Dentro do Partido dos Trabalhadores, há insatisfação de nomes importantes, como o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (SP), que se sente humilhado por Lula, que não o escolheu para nada. É hoje apenas o ex-presidente da Câmara. Para piorar a situação, há uma luta aberta pela sucessão paulista, envolvendo três nomes de peso do PT: João Paulo, a ex-prefeita Marta Suplicy e Aloizio Mercadante. Eles se sabotam o mais que podem. Abertamente.

Ocorre ainda que a esquerda do PT está cada vez mais irritada com as posições políticas e econômicas assumidas pelo governo, porque as consideram conservadoras. "O anúncio do fim do acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) é uma farsa, porque mantiveram toda a doutrina do acordo, como o superávit primário e o ajuste fiscal. E vão continuar a pagar a dívida", ataca o deputado Ivan Valente (PT-SP).

Para piorar tudo, houve a MP 232. De acordo com um dos principais assessores do presidente Lula, a idéia original era fazer uma medida provisória com a correção da tabela do IR, conforme negociado com as centrais sindicais em novembro. A divulgação do acordo com as centrais foi motivo de festa no Palácio do Planalto, a ponto de o protocolo ser quebrado e os presidentes da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Luiz Marinho, e da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, terem subido ao gabinete do presidente da República de bermuda e não de terno e gravata, como ocorre normalmente.

Acontece, conta o assessor do presidente Lula, que a Receita Federal não aceitou apenas a orientação de fazer a correção na tabela do IR. Exigiu uma contrapartida. Mas o Ministério da Fazenda agiu na surdina.

Não comunicou a nenhum líder nem à Casa Civil que acrescentaria o aumento do imposto dos prestadores de serviço no texto. "São loucos. Vocês vão arrumar confusão. Isso não passa de jeito nenhum", disse o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, assim que soube do que ocorrera.

"Os prestadores de serviço são cerca de 200 mil. Não representam tanto para tanto desgaste. O problema é que esse pessoal da Receita só quer arrecadar. Foram brigar com os advogados, os médicos, os dentistas, os editores de jornais impressos e de televisão. Tinha que dar nisso", diz o deputado Ricardo Zarattini (PT-SP). "Foi o ato de maior desgaste para o governo Lula", acrescenta ele, um dos grandes amigos do ministro José Dirceu no Congresso.