Título: IBGE vê ameaça aos investimentos
Autor: Jacqueline Farid
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/04/2005, Economia, p. B3

A indústria brasileira chegou a fevereiro estacionada no mesmo nível de produção de dezembro e com forte desaceleração dos investimentos. A produção caiu 1,2% em relação a janeiro - o pior resultado ante mês anterior desde junho de 2003 (-1,5%) - e, apesar do aumento de 4,4% comparado a fevereiro de 2004, confirmou a perda de ritmo ocorrida desde o fim do ano passado. Para o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), os dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que "o boom industrial do ano passado ficou para trás". Mas, para o chefe da Coordenação de Indústria do IBGE, Silvio Sales, a queda de 1,2% na produção pode estar relacionada ao menor número de dias úteis em fevereiro, fenômeno não eliminado totalmente pelo ajuste sazonal (que exclui as características de determinado período).

Sales destacou que o setor mostrou "estabilização" ao ficar estacionado no mesmo nível de dezembro. Apesar da estagnação, acrescentou, os dados de fevereiro mostraram queda dos investimentos (espelhados na produção de bens de capital) e mudança na composição do crescimento industrial, com maior peso dos bens de consumo, impulsionados pelo crédito e pela massa salarial.

Segundo o técnico, a pesquisa mostra que "há uma mudança na composição interna" do crescimento da produção. "O que está se confirmando é uma alteração no perfil (do crescimento) com bens de produção duráveis e não-duráveis com taxas mais altas."

No caso dos bens de consumo duráveis (automóveis, eletrodomésticos), Sales observou que a manutenção de taxas muito elevadas de crescimento ocorre porque o volume de crédito continua muito alto. "Há aumento de crédito com desconto em folha e há também crescimento da massa salarial, que beneficia os não duráveis."

Os bens de consumo duráveis cresceram 11,8% em fevereiro ante janeiro, após queda de 5,1% em janeiro em relação a dezembro. Na comparação com fevereiro de 2004 , o crescimento foi de 22,4%, após expansão bem menor, de 3,5%, em janeiro ante igual mês de 2004.

No caso dos não-duráveis (vestuário, calçados, alimentos), houve queda de 4,3% na produção ante janeiro, mas, segundo Sales, esse resultado "não reverte a trajetória de crescimento" dessa categoria, que acumula aumento de 7,5% no primeiro bimestre deste ano ante igual período do ano passado. Na comparação com fevereiro de 2004, a produção de não-duráveis cresceu 5,3%.

Para os economistas da GRC Visão, a renda real, apesar de crescente, "ainda permanece em um nível baixo para fomentar o crescimento vigoroso" nos setores de bens de consumo semi e não-duráveis. Além disso, as altas da taxa de juros "têm afetado muito mais os investimentos no setor produtivo do que o consumo de bens duráveis", avaliação com a qual concorda Sales.

INVESTIMENTOS

O economista do IBGE admitiu que a desaceleração no aumento da produção de bens de capital para 1,1% em fevereiro, em relação ao mesmo mês de 2004 - bem inferior ao crescimento de 6,8% em janeiro ante janeiro do ano passado -, "pode ser que reflita algum impacto dos juros na decisão de investimentos dos empresários". A produção de bens de capital, que junto com duráveis puxou a indústria em 2004, caiu 3,1% em fevereiro, em relação a janeiro.

Sales destacou que a desaceleração em bens de capital está sendo puxada especialmente pela queda de equipamentos para o setor agrícola, o que para ele pode estar relacionado a aumentos de custos, elevação dos juros ou às reduções nas projeções de safra para este ano. No caso dos bens de capital para a indústria - que mostram investimentos na capacidade produtiva -, a avaliação é que há desaceleração, mas a taxa permanece positiva. No primeiro bimestre do ano, os bens de capital para agricultura tiveram queda de 26,7% na produção ante igual período do ano passado. Os bens de capital para a indústria cresceram 6,3% no bimestre, taxa bem inferior aos 16,1% acumulados em todo o ano passado.

O economista sublinhou que, antes de concluir que a redução no ritmo de produção dos bens de capital significa queda de investimentos, é preciso confrontar os dados com as importações desses produtos, que vêm crescendo a taxas acima de 20%, o que, segundo ele, pode significar manutenção dos investimentos.