Título: Francis Arinze, da Nigéria, conselheiro do papa
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/04/2005, Especial, p. H8

O nigeriano Francis Arinze, de 77 anos, é a esperança de um papa africano, 16 séculos depois. O cardeal, que desafiou a família e se converteu ao catolicismo na infância, foi durante os últimos 20 anos conselheiro de João Paulo II no diálogo entre a Igreja Católica e outras religiões. Mas suas origens no Terceiro Mundo - onde estão dois terços dos católicos - não trouxeram necessariamente idéias progressistas para o Vaticano. Arinze acredita que o incentivo ao uso do preservativo não contribuiu em nada para barrar a epidemia da aids e ainda encorajou a promiscuidade. Também não aprova, como o cardeal alemão Joseph Ratzinger, a nova forma de celebrar missas como se fossem shows, na linha do brasileiro padre Marcelo Rossi. "Amaria mais silêncio e menos música retumbante. Mais reflexão e menos protagonismo do celebrante", disse ao jornal Corriere della Sera.

O livro Conclave, escrito pelo vaticanista americano John Allen Jr., conta o que Arinze respondeu ao ser questionado certa vez sobre homossexualidade pelo jornal The Times, de Londres. "Quando vejo rapazes de rabo de cavalo, brincos e batons nas ruas romanas, tenho vontade de lavar suas cabeças com água benta."

Arinze nasceu na pequena vila nigeriana de Eziowelle, em 1932. Sua família era líder de uma tribo chamada Ibo, de religião aminista (conjunto de crenças africanas que atribuem alma a seres vivos, objetos inanimados e fenômenos naturais). Aos 9 anos, impressionado por uma missão irlandesa, converteu-se ao catolicismo e logo passou a atuar como coroinha. A família no começo virou a cara, ofendeu-se, mas, quando Arinze foi ordenado padre em 1958, todos acabaram virando católicos. Numa visita à terra natal, há dez anos, converteu a última aminista de Eziowelle.

Popular, charmoso, bem-humorado e principalmente diplomático, o cardeal Arinze foi a peça-chave do Vaticano nas difíceis relações com os muçulmanos. Fala várias línguas - aprecia especialmente o latim - e adora viajar. Sobre suas chances de suceder João Paulo II, costuma dizer: "O Ocidente ainda não está maduro para um papa negro. Seria um desafio para a Igreja, para o mundo e para a mídia."

O último papa do continente foi Gelasius I, no século 5. João Paulo II não aumentou o número de cardeais africanos - eram 12, em 1978, e são 11, hoje -, mas levou muitos deles para o Vaticano. Segundo o teólogo Mario Aguilar, da Universidade de St. Andrews, fortalecendo o papel da África na Igreja, João Paulo II "aumentou as possibilidades de ver um papa africano".