Título: A CONVERSA
Autor: Vasconcelo Quadros
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/04/2005, Nacional, p. A4

Voz A: (Liga e fala por telefone com outrem.) Alô? Quem? Diga, Renatinho. Oi? Tem. É. Que que é? Vou. Querem voltar? Quer voltar? É bom ou ruim? Tá bom, obrigado. (A voz A finaliza o diálogo ao telefone e volta a conversar com as vozes B e C.) É a última parcela, é?

Voz C: É a última?

Voz B: É a última. Tá, ficando um resíduo de duzentos e pouco, tá? Lá ainda, né...

Voz A: Duzentos e pouco por quê?

Voz B: É, duzentos e pouco reais lá, tá? Porque nós não fechamos em cima dos duzentos e poucos mil...

Voz A: Mas que porra, cara. Pagar tudo e ainda não tem nem cinqüenta por cento pronto!

Voz B: Rapaz, eu faço isso aí, rapaz. Você pode ter certeza! Isso aí agora eu já vou levar outro cara pra também pra furar os poços. Só tem duas caixas, só tem duas caixas pra aprontar...

Voz A: O caminhão, o caminhão tá parado.

Voz B: Não, mas o menino tá vindo agora e tá indo outro pra lá. Eu já falei com o Augusto. Tá? Só tem duas caixas pra fazer já, só. As três já tá pronta.

Voz A: Você tira o meu daqui também, tá?

Voz B: Claro. Claro, o seu é imperdoável...

Voz A: O meu é 20, é 25 e 200.

Voz B: Quanto é o do senador?

Voz A: O meu é dez por cento.

Voz B: O teu é dez por cento e o do senador?

Voz A: Lá é o coisa que sabe lá, como é o...

Voz B: Puta que pariu, Paulo. Aí eu não vou ganhar nada, bicho, nesse negócio aí, ó...

Voz A: O meu é dez por cento. Todas obras minhas é dez por cento. Todas.

Voz B: Puta que pariu. Vou trabalhar só pros outros. Não é nem questão de trabalhar pros outros, a questão é que essas obras foram, elas aumentaram o cimento, aumentaram tudo, tô fazendo essa obra toda com concreto aparente...

Voz A: Você sabe que o meu sempre foi 10%, todo mundo me dá.

Voz B: Porra, o Augusto não me falou isso. O Augusto me falou que eram quinze por cento ao todo.

Voz A: De quê?

Voz B: Quinze por cento ao todo.

Voz A: Deve tá é doido o Augusto. Agorinha, agorinha eu repassei o dinheiro do Mauro da escola. Dez por cento.

Voz B: Então o senador não levou nada, aí. Nessa daí não.

Voz A: Ele leva o dele. (Nesse momento há "stop/pause" na gravação e uma voz pergunta: "Por que que parou?" E voltam a ser gravadas as conversas.)

Voz A: (Nesse momento o gravador capta a voz A, ao longe, falando ao telefone) Augusto, olha, eu tô acabando de ??? É 20% naquele negócio do Jucá, é? Vinte por cento, dez meu e dez do ??? Ó Augusto, vê com eles aí como é que vai ficar, o que eles negociaram ??? É dez por cento pra mim. (A voz A volta a falar com as outras vozes acima identificadas.) Cadê o outro, me dá os outro aí. ???

Voz B: E esse aqui?

Voz A: Deixe esse aí por enquanto.

Voz B: Falta eu assinar, né?

Voz A: Não, não assine ainda não, calma.