Título: Traje social faz o vereador, entende a Câmara de Mogi
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/04/2005, Nacional, p. A14

Che Guevara e o vermelho do PT caíram em desgraça, foram banidos e perderam a vez para um certo tenue de ville - ou trajes sociais que, desde março, os 16 vereadores de Mogi das Cruzes estão obrigados a usar por força de alterações no regimento interno da Câmara municipal. O retoque às pressas no estatuto foi a saída que o presidente da Casa, Rubens Benedito Fernandes, o Bibo, encontrou para pacificar os ânimos e pôr fim a uma polêmica envolvendo a vereadora Inês Paz, do PT.

Professora estadual, 52 anos, mãe solteira "por opção", Paz ia às sessões ao estilo Heloísa Helena - a senadora rebelde que o PT expulsou de seus quadros -, metida em calça jeans batida, tênis gastos e camiseta do partido pelo qual se elegeu vereadora duas vezes.

Ora irrompia no plenário vestindo vermelho com a estrela do PT em destaque, ora exibindo a estampa do Che. No início de março, essa informalidade suscitou acirrado debate no Legislativo mogiano.

Antonio Lino, vereador pelo PL, insurgiu-se severamente contra os trajes da colega. O plenário parou para assistir ao bate-boca, e Mogi, a 50 quilômetros de São Paulo, por um momento deixou de lado dois projetos de suma importância para a vida de seus 350 mil habitantes - um deles sobre a proibição de animais em circos, rodeios "e assemelhados" e o outro sobre desconto de 50% do IPTU para proprietários de terrenos localizados em áreas de preservação ambiental.

Na avaliação de Lino, quinto mandato consecutivo, as vestes de Paz não condizem com a austeridade da Casa. Ele disse que a vereadora adentrava ao plenário com tênis rasgado. "Partido é agremiação, é igual a um time de futebol", disse ele, chamando a petista para o debate. "Eu tenho paixão pelo meu time, sou corintiano de carteirinha. Se o Corinthians ganha, eu venho com a camisa alvinegra? Não dá. Cada segmento tem a sua vestimenta. O juiz usa toga. O padre usa batina. E a noiva usa vestido para casar, não é?"

ROUPINHA SIMPLES

"Nunca fui questionada sobre minha roupa", indignou-se Paz, única representante de seu partido na Câmara. "Sempre usei camiseta do Che e de movimentos sociais. É o meu dia-a-dia na rua. Não alterei meu modo de ser porque fui eleita. Ando decentemente vestida. Qual é a indecência de um vereador eleito andar vestido de maneira simples como o povo? Não aceito demagogia. Mesmo porque a Câmara é um lugar político-partidário." Ela disse que sabe "distinguir as coisas", tanto que na diplomação e na posse não foi de camiseta, pôs uma roupinha simples.

Lino foi à tréplica. "A senhora sabe que está fora dos padrões normais. No seu gabinete pode ir do jeito que quiser. Não estou pedindo que vá andar de social pelos bairros, mas aqui dentro, em plenário, na hora de discutir e votar os projetos e os interesses dos munícipes, é coisa mais restrita, solene."

Bibo, o presidente, entrou em cena. Como árbitro da contenda, reuniu a Mesa - ele, o primeiro-secretário e o segundo - e ficou decidido que dois artigos do regimento interno, o 73 e o 95, sofreriam mudanças por meio de projeto de resolução. Bibo é do PP. Garante que não está promovendo retaliação partidária.

A regra vale para os 16 vereadores da Casa. Longe de agir como censor, pesou na iniciativa de Bibo o que ele define como "necessária austeridade e solenidade devidas aos recintos representativos nos órgãos maiores, designados como poderes". O presidente faz questão de assinalar que a medida não implicará novos gastos com dinheiro público.

Para Bibo, terceiro mandato, a "matéria acaba com as indefinições do regimento referentes a trajes dos parlamentares nas sessões em plenário".