Título: Condoleezza faz elogios ao Brasil, mas critica tolerância com Chávez
Autor: Denise Chrispim MarinExpedito Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/04/2005, Nacional, p. A4

"Não adianta um governo ser democraticamente eleito se não governar democraticamente", disse ela, após argumentação de Amorim A secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, deixou ontem três recados diretos ao governo brasileiro sobre seu papel de liderança crescente na América do Sul e no mundo. Primeiro, destacou que vê "com bons olhos" os esforços do Brasil para consolidação democrática da região. Lembrou que Brasília não estará só nesse desafio e deve contar com os EUA. Por fim, ao ser questionada sobre sucessivos respaldos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao colega venezuelano Hugo Chávez, Condoleezza disse que "não adianta governo ser democraticamente eleito se não governar democraticamente" e insistiu que os EUA esperam que a Carta Democrática da Organização dos Estados Americanos (OEA) seja cumprida no Hemisfério. "Não adianta um governo ser democraticamente eleito se não governar democraticamente. Todos queremos uma Venezuela completamente livre e democrática", afirmou a secretária de Estado, ao lado do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, durante entrevista à imprensa. "Os problemas não são entre a Venezuela e o Brasil ou entre a Venezuela e os EUA. Trata-se da democracia e da liberdade aos quais o povo venezuelano tem o direito de acesso", completou, em uma lógica bastante similar à adotada por Washington para justificar sua política em favor da democratização de países do Oriente Médio.

Com essas declarações, Condoleezza rebateu a recorrente argumentação do governo brasileiro de que Chávez foi eleito democraticamente e teve mandato reconfirmado por referendo. Minutos antes, o próprio Amorim havia repetido essa argumentação ao mencionar que não havia se esquivado de tratar do tema com sua interlocutora. "Como em qualquer outra sociedade, existem problemas (na Venezuela) que devem ser discutidos pelo povo venezuelano", disse Amorim. "O que pudermos fazer para ajudar no encaminhamento produtivo - sempre respeitando, eu repito, a soberania -, nós faremos. Continuaremos a dialogar até porque somos amigos da Venezuela e temos interesse que seu desenvolvimento se dê de forma mais democrática e harmônica."

Apesar de Condoleezza ter diplomaticamente contornado a questão sobre as relações Lula-Chávez, assessores do Departamento do Estado destacaram que Washington deverá endurecer posições sobre as políticas internas da Venezuela, classificadas como autoritárias. Ao mesmo tempo, uma das iniciativas da diplomacia americana será a busca de apoio na América Latina para votar resolução de condenação às práticas do governo Chávez na OEA, com base justamente na Carta Democrática - um instrumento que prevê a retirada do país que se afastar desse modelo da organização.

Condoleezza destacou que, nos últimos 30 anos, a América Latina progrediu na consolidação das instituições democráticas e apresentou como exemplo o fato de a única cadeira vaga na OEA ser a reservada a Cuba. "O Brasil é um grande país que apresenta um grande conjunto de diversidade étnica. Com os EUA, o Brasil vai contribuir para um Hemisfério mais próspero e democrático", disse Condoleezza. Ela mencionou que ambos os países dialogam positivamente em relação à crise no Equador.

Amorim e Condoleezza também trataram da possibilidade de o presidente George W. Bush visitar o Brasil em dezembro. Ao final do encontro de pouco mais de uma hora, assinaram comunicado em que os dois países apóiam a criação de um Fundo Democrático da ONU, a missão da OEA em Quito e a necessidade de mobilizar a comunidade internacional para reconstruir o Haiti.

Por fim, para o alívio do governo brasileiro, Condoleezza deu avaliação positiva à iniciativa brasileira de reunir líderes de países sul-americanos e árabes em Brasília, dias 10 e 11 de maio. Lembrou que o fato de o conjunto dos 22 países da Liga Árabe contar com PIB equivalente ao da Espanha é claro sinal da necessidade de maior interação com o mundo. Condoleezza deixou o Itamaraty, ontem, sem deixar o esperado apoio ao ingresso do País no Conselho de Segurança da ONU.