Título: 'Consumo cresce apesar da Selic'
Autor: Vânia CristinoJosé Ramos
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/04/2005, Economia, p. B1

Presidente insiste que política monetária não afetou varejo Pelo segundo dia consecutivo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva saiu em defesa das atuais taxas de juros estabelecidas pelo Banco Central (BC). Ontem, ele afirmou que, apesar dos juros, o consumo cresce e o varejo não foi atingido. "As pessoas falam que o aumento da taxa Selic vai diminuir o consumo, mas a verdade nua e crua é que a quantidade de dinheiro que está sendo jogada no mercado não estava prevista nos manuais da ordem econômica deste País." Citando erroneamente o valor da taxa de juros básica da economia, que na semana passada subiu para 19,5%, Lula explicou: "É por isso que, mesmo com a taxa Selic a 19,25%, o mercado interno continua a crescer, o varejo está crescendo, os supermercados estão vendendo muito - porque as pessoas estão tendo possibilidade de acesso a dinheiro que antes não tinham." Lula referia-se às novas modalidades de crédito concedidas pelo governo, como os empréstimos descontados em folha para trabalhadores e aposentados e as linhas de microcrédito para consumo e produção.

A injeção de crédito é apontada por economistas como algo que atua na direção contrária à pretendida pelo BC quando eleva os juros. O objetivo do aumento da taxa é inibir o consumo, evitando pressões inflacionárias. Nesse sentido, as novas linhas de crédito são um dos motivos pelos quais o juro precisa estar alto. E é por isso que se diz que há contradição entre a política de juros e a atuação do governo na área de crédito.

Na véspera, Lula justificou os juros, ao atribuir ao comodismo do consumidor o fato de os bancos cobrarem caro pelo dinheiro que emprestam. Para ele, os brasileiros deveriam "levantar o traseiro" e procurar taxas mais baixas.

As afirmações do presidente foram feitas ontem em mais um discurso de improviso, desta vez para os produtores de café do País. Lula se declarou "viciado" em café, a ponto de ir "dormir com azia". Lula destacou que o Brasil "é praticamente imbatível" em algumas áreas do comércio internacional e todos têm de se preparar, porque "temos muitos adversários nesta área". "Quando alguém cresce significa que alguém diminuiu" e isso cria uma disputa enorme no mercado, "pior do que São Paulo e Corinthians, pior que São Paulo e Palmeiras".

Ao advertir que, "se alguém pensa que tem saída individual para algum produtor ou empresário, pode tirar o cavalo da chuva porque não tem", Lula propôs "um pacto de brasilidade, um pacto patriótico", para unir governo e empresários para enfrentar os oponentes e concorrentes de forma coesa.

Em seguida, comparando o Brasil a uma mulher feia, o presidente pediu que ninguém falasse mal do País lá fora. "Nunca vi ninguém sair na rua contando as brigas que teve dentro de casa e nunca vi ninguém dizer que sua mulher é feia", afirmou. "Se a gente não diz essas coisas íntimas para preservá-las, por que na questão do País a gente não faz o mesmo?"

Lula citou a viagem que fará a Tóquio, em maio, para vender álcool. "O Japão quer comprar, mas quer determinadas garantias. O (Luiz Fernando) Furlan (ministro do Desenvolvimento) tem divergências com o setor (sucroalcooleiro), o Roberto Rodrigues (ministro da Agricultura) tem, eles têm. Eu disse: vocês se juntem, montem um grupo de trabalho." E avisou que quer chegar a Tóquio com uma posição coesa entre governo e o setor produtivo; quem destoar não vai na viagem".