Título: Proposta de instituir carreira única divide policiais
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2005, Nacional, p. A4

Delegados condenam reserva de vagas e pedem autonomia; agentes e escrivães defendem reestruturação

O estatuto que vai dar vida à Polícia Federal ainda é um projeto, mas já divide carreiras irmãs. Delegados de um lado, agentes e escrivães do outro, pega fogo a polêmica proposta da carreira única, que põe no mesmo patamar todas essas categorias policiais. Para o delegado Armando Rodrigues Coelho Neto, que preside a Federação Nacional dos Delegados da PF, este não é o momento para que o projeto da lei orgânica seja enviado ao Congresso. "O PT é um partido que visivelmente guarda um ranço autoritário, um revanchismo muito grande contra a PF", declara Coelho Neto.

"A gente não imagina que no governo do PT a gente possa ter uma lei orgânica digna", insiste o delegado. "É impossível tentar negociar com um governo como esse, tentar obter alguma coisa que vá beneficiar a corporação. Eles distorcem tudo."

Coelho Neto fala sobre independência. "Quando a gente quer autonomia é justamente para não sofrer ingerências políticas. Aí, com a desculpa de democratizar isso e aquilo começaram a suprimir poderes dos delegados. A título de agradar o proletariado deram poderes aos agentes. É um governo difícil."

Ele defende autonomia orçamentária para a PF. E observa que a falta de concursos públicos para reforço do pessoal e a exigência de diploma de nível superior para qualquer cargo da PF levou ao surgimento de "uma nova classe, com características indefinidamente híbridas, com pretensões igualitárias, niveladoras, como se um segmento armado como a PF pudesse prescindir da hierarquia e da disciplina".

INCONSTITUCIONAL

O delegado Anderson Souza Daura, diretor-executivo do Sindicato dos Delegados da PF em São Paulo, defende a atuação de um corregedor independente. "Sendo delegado de carreira não tem problema", declara Daura. Mas ele condena com veemência a idéia de carreira única. "A reserva de vagas para os cargos de agentes, escrivães e papiloscopistas é inconstitucional."

Daura adverte que a Constituição impõe como regra a realização do concurso público. "O acesso à carreira de delegado sem passar pelo concurso é um retrocesso, a Carta exige o concurso. Isso fere o princípio de acessibilidade a cargo público."

João Valderi de Souza, presidente em exercício da Federação Nacional dos Policiais Federais, considera que o projeto que representa a real necessidade da PF e da sociedade é o que prevê "a reestruturação da carreira policial federal em cargo único, valorizando a competência para fins de promoção na carreira".

Valderi ressaltou que há 18 anos está "nessa luta da lei orgânica, para dar um norte à PF". Anotou que a entidade "não aceita, sob hipótese alguma, que os integrantes dos cargos de agente, escrivão e papiloscopista sejam colocados em extinção, na medida em que exemplos de carreiras similares, como foram os casos dos policiais civis e militares dos ex-territórios, demonstram de maneira cabal a total perda da identidade, de prerrogativas e direitos, afora a enorme defasagem salarial que tais servidores vieram a sofrer em decorrência de tal situação".

Ele defende o fim das diferenças e brigas entre as carreiras policiais. "Quem ganha com as brigas é o patrão."