Título: MST promete a maior onda de mobilizações no governo Lula
Autor: Roldão Arru
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/04/2005, Nacional, p. A7

O Movimento dos Sem-Terra (MST) acredita que chegou a hora da verdade para Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com os líderes da organização, o presidente não cumpriu suas promessas de realizar uma ampla reforma agrária no País e o prazo está se esgotando. Pela estimativa do MST, ele finda em junho. Se até lá o governo não fizer uma ofensiva a favor da reforma, com a liberação de mais recursos para o Ministério do Desenvolvimento Agrário, não haverá outra oportunidade. "É agora ou nunca", afirma João Paulo Rodrigues, porta-voz da liderança nacional. "Mesmo que o dinheiro seja liberado no segundo semestre, não dará mais tempo para alcançar as metas do Plano Nacional de Reforma Agrária, que prevê o assentamento de 400 mil famílias até o fim do governo. Em 2006, por causa das eleições, a questão da terra será posta em segundo plano."

Essa análise norteia os preparativos daquela que pode ser a maior ofensiva do MST neste governo. Ela deve ganhar vulto em meados deste mês e prosseguir até meados de maio. No dia 17 de abril, data em que se lembra o massacre de 19 sem-terra em Eldorado de Carajás, no Pará, a direção nacional do movimento planeja reunir 10 mil pessoas em Goiânia, Goiás, para um ato de protesto. É provável que de lá saiam marchando em direção a Brasília, mas até a semana passada essa informação não havia sido confirmada pelos organizadores.

O calendário de ações do MST para abril e maio deve ser definido nesta semana. Estão previstas desde marchas e manifestações ao recrudescimento das ocupações de terras. "Vamos jogar toda a força do movimento neste período", diz Rodrigues.

A meta é pressionar o governo para que volte atrás em sua decisão, anunciada em março, de impor um contingenciamento de R$ 2 milhões no orçamento do Desenvolvimento Agrário. Com o que sobrou, de acordo com o MST, confirmadas por técnicos do ministério, será possível assentar 35 mil famílias neste ano. Muito menos do que as 115 mil famílias estipuladas no Plano Nacional, lançado por Lula no final de 2003.

Desde janeiro, o MST vem organizando suas forças para a ofensiva deste mês. Também tem se esforçado para obter o apoio de outras organizações para sua iniciativa. Já ganhou a adesão das organizações de defesa dos direitos indígenas, que pretendem acampar em Brasília no final de abril.

Nessa luta por verbas, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e os líderes do MST estão no mesmo barco. Desde que o governo anunciou o contingenciamento, Rossetto já criticou publicamente a decisão em três ocasiões. Uma delas, na semana passada, durante um depoimento no Senado.

Segundo o secretário-executivo do ministério, Guilherme Cassel, se não houver suplementação de verbas entre abril e maio, todo o fluxo de desapropriações e assentamentos da reforma agrária no ano será prejudicado e as metas comprometidas. "A reforma funciona como uma linha de montagem, com as fases de vistorias, desapropriações e compras de terras, assentamentos, regularizações, formação de estoques. Quando você pára uma parte da linha, toda a montagem sofre."

Ao mesmo tempo em que se unem para pressionar o governo em busca de mais verbas, o MST e o ministério trocam farpas sobre os números da reforma. Apesar de o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) divulgar em seus relatórios que no ano passado foram assentadas 82 mil famílias, os sem-terra espalham que o número real não passa de 25 mil.

Segundo Rodrigues, o governo vitaminou artificialmente as estatísticas com a adição de casos de reassentamentos de famílias em áreas já existentes da reforma, que haviam sido abandonadas ou vendidas ilegalmente e foram retomadas. Também teria enfiado no bolo os assentamentos realizados em áreas devolutas dos governos estaduais.

"Os números do governo são uma balela", diz Rodrigues. "São inaceitáveis. Só servem para mostrar que o governo fez poucas desapropriações de terras e deixou claro o descaso com a situação das milhares de famílias que reivindicam espaços para trabalhar e plantar."

O secretário do ministério contesta: "Agora que conseguimos mostrar avanço, o MST quer mudar o conceito de reforma. Para nós, cada família nova sobre a terra faz parte da reforma, não importando se a terra é devoluta, se foi comprada, desapropriada, ou retomada de posseiros e fazendeiros."