Título: Dirceu sobre política externa: 'Não faço nada sem Lula concordar'
Autor: Ariel Palacios Enviado
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/04/2005, Nacional, p. A8

Ministro diz que não é chanceler paralelo e que não atropelou Itamaraty ao visitar Venezuela "Não faço nada sem o presidente Lula concordar." Dessa forma, o chefe da Casa Civil, José Dirceu, se defendeu das críticas que o indicam como espécie de chanceler paralelo, que estaria agindo à revelia do Itamaraty. "Não! Nada disso", disse Dirceu, esticando a pronúncia das vogais de sua negativa para enfatizar que seu trabalho "é sempre" sob a orientação de Lula e do chanceler Celso Amorim. "Ele tem ascendência sobre minha atuação. Não faço nada sem ele concordar." O ministro também indicou que não tem intenção de ficar desempregado: "Evidentemente, não posso ter uma atuação que não esteja de acordo com o que o presidente e o chanceler indicam, pois seria demitido, não tenha dúvida alguma."

Nos primeiros minutos em Montevidéu, Dirceu - acompanhado do assessor de Relações Internacionais, Marco Aurélio Garcia - reuniu-se na sala VIP do Aeroporto de Carrasco com Michelle Bachelet, candidata do Partido Socialista Chileno à Presidência.

"Assunto é que não falta", explicou Dirceu, que se reunirá com o chefe do Gabinete de Ministros da Argentina, Alberto Fernández, virtual braço direito do presidente Néstor Kirchner. De bom humor, declarou que sua relação com a direção do Itamaraty "é a melhor possível". Segundo ele, também é "excelente" a relação com o chanceler, o vice-chanceler e a maioria dos embaixadores.

"Evidentemente, quando há um pedido de reunião reservada, faço reservada. Mas, toda vez que há uma reunião com um presidente ou embaixador de outro país o embaixador Américo Fontenelle está presente, tomando nota. Os relatórios são enviados à Presidência da República e ao Itamaraty. Isso (as críticas) é uma ficção. Seria ingênuo fazer algo sem a orientação do presidente e do chanceler. Só faço o que presidente me pede, todos sabem disso."

Dirceu insistiu que não é um chanceler paralelo: "Em primeiro lugar, não estou substituindo o Itamaraty em nada, minha relação com o presidente (Hugo) Chávez (Venezuela) é de outra natureza. O que posso fazer? Não tenho culpa. É como no caso dos republicanos. Três, quatro anos atrás, estabeleci uma série de relações com os republicanos. E, por isso, tenho relações nos Estados Unidos com o presidente (George W.) Bush. Achei que era necessário, pois um dia a gente podia governar o Brasil e os republicanos, os EUA. As coisas acontecem assim na vida."

Indagado se com Chávez a relação havia se iniciado assim, Dirceu deu um sorriso e comentou: "Com o Chávez a história é mais... Bom, um dia, quando fizer 70 anos, eu conto."

Dirceu definiu sua recente visita à Venezuela como "muito boa". "Com o presidente Chávez fizemos um repasse das relações do Brasil com a Venezuela, a integração no Mercosul, principalmente os investimentos comuns, o aumento do comércio, a ajuda mútua e analisamos o quadro político. Chegamos ao acordo que é fundamental trabalharmos pelo desenvolvimento econômico e social de nossos países, fortalecer o Mercosul e a Comunidade Sul-Americana de Nações."

O ministro negou que sua missão tenha sido a de tentar convencer Chávez a voltar atrás na suspensão das relações militares com os EUA: "Isso não constou de minha agenda. Em nenhum momento conversamos sobre isso." E completou: "Não temos de discutir a política interna de um país. Com Chávez, tanto o presidente Lula, Marco Aurélio Garcia e eu temos relações de amizade, nunca faríamos uma grosseria dessas nem um erro político desses de intrometer em um assunto que é da alçada da soberania da Venezuela. E os EUA não têm por que fazer um pedido desses ao Brasil."