Título: Rede de intrigas entre PT e PMDB irrita Lula e ameaça projeto 2006
Autor: Christiane Samarco Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2005, Nacional, p. A3

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está cada vez mais irritado com a crise de relacionamento entre PT e PMDB, alimentada por disputas internas e pelo fogo cruzado que atinge deputados, senadores, ministros e o governo. Em conversas reservadas, Lula disse que a rede de intrigas nos partidos de sua base aliada tem passado dos limites. A guerra nos dois fronts é o maior entrave à operação montada por ele para fechar um acordo com o PMDB que garanta a governabilidade e assegure o apoio do partido à sua reeleição, em 2006.

"Estou convencido da necessidade de uma aliança forte com o PMDB. Mas, quando tudo começa a engrenar, sempre aparece alguma coisa", comentou o presidente, de acordo com um ministro, um dia antes de embarcar para Roma, onde assistirá ao enterro do papa.

Lula começou a semana atraindo o presidente do PMDB paulista, Orestes Quércia, um dos comandantes da ala rebelde do partido. Depois de uma conversa considerada "excelente" no Planalto e de articulações políticas para cativar o presidente nacional do PMDB, deputado Michel Temer (SP), viu quase tudo voltar à estaca zero em menos de 24 horas.

Não bastasse o constrangimento com as denúncias que envolvem seu afilhado, o ministro da Previdência, Romero Jucá (PMDB), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disputa espaço com Temer e não se entende com o chefe da Casa Civil, José Dirceu.

O parceiro preferencial de Renan é o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP) que, por sua vez, vive às turras com o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP).

A relação com o governo está "péssima" por conta da desconfiança de parte a parte. Em comum, as várias alas do PMDB, do PT e do governo só têm o desconforto e a irritação com a série de denúncias de uso indevido de financiamento público e suspeita de corrupção que pesam contra Jucá, símbolo da aliança em jogo.

Alvo do descontentamento, Jucá é quem tem pago a conta do conflito. Já a fatura política é debitada na conta do Planalto que, em meio à brigalhada, vê a cada dia mais distante o sonho de ter uma base de sustentação estável no Congresso.

Foi em clima de contraponto a Mercadante - fiador da indicação de Jucá, apresentada por Renan - que João Paulo atacou o ministro na quarta-feira, considerando "incompatível" ter o comandante da Previdência na condição de "suspeito". Amigos de Jucá avaliam, porém, que as estocadas do deputado foram feitas sob encomenda para desgastar o líder do governo no Senado. Motivo: João Paulo e Mercadante são adversários no PT paulista e disputam a indicação para a eleição ao governo de São Paulo.

Petistas também acreditam que parte da crise entre PT e PMDB é efeito colateral da reforma ministerial inconclusa. Por este raciocínio, a manifestação pública de João Paulo também tem o objetivo de despejar Jucá da Previdência para reabrir a reforma que o deixou fora da equipe de Lula. Além disso, o ex-presidente da Câmara reforçaria suas diferenças com o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo.

"Um sonho mal realizado deixa a gente meio amargo", provocou o líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB). "Isso não tem nenhuma procedência", reagiu João Paulo, desmentindo qualquer intenção de pressionar por uma mexida no ministério com as críticas a Jucá. "O presidente Lula sabe da minha posição. Sabe, inclusive, quem eram os meus candidatos a ministro e que eu estava fora da minha lista."

João Paulo afirmou ainda que o objetivo de seus reparos foi apenas ajudar o PMDB e o governo a resolverem definitivamente o problema da Previdência. "O ministério está parado", insistiu. Temer deixou claro que que não teve participação na escolha do ministro-problema para a Previdência. "O PMDB, institucionalmente, não indicou nenhum ministro porque optou pela entrega dos cargos. Sendo assim, não tem que defender Jucá", observou.

Além do bombardeio sobre seu apadrinhado, o presidente do Senado é obrigado a amargar o que chama de "diálogo paralelo" de Dirceu com Temer. O grupo de Renan e do senador José Sarney (PMDB-AP) teme que a hegemonia do PMDB no Senado incomode o Planalto. A suspeita é que Dirceu esteja se movimentando para esvaziar a bancada de 23 senadores peemedebistas. Dirceu patrocinaria a criação de uma bancada do PP no Senado com quatro senadores egressos do PMDB.