Título: No vôo para Roma, um ensaio para a conciliação
Autor: Expedito Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/04/2005, Nacional, p. A6

Só a morte do papa João Paulo II poderia juntar, numa conversa sobre política francesa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Foi o que ocorreu, em clima descontraído, no vôo de 11 horas e meia ontem entre Brasília e Roma, no Airbus presidencial. Mas não foi só com FHC. Lula conversou bastante com o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). Ao chegar a Roma, Severino contou que ele e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disseram que vão tomar providências para reduzir o número de medidas provisórias e só passarão as urgentes. Lula teria concordado, desde que os dois combinem com o Planalto.

Sem mostrar culpa nos episódios em que criou dificuldades para o governo, Severino repetiu a Lula o argumento de que tem crédito com o presidente, pois lhe proporcionou, com algumas frases infelizes, a chance de parar a reforma ministerial. "Eu disse a ele que estou com crédito, porque eu o salvei na reforma ministerial. Eu fiz aquilo depois de ter pensado muito." Em Roma, Severino estava bem humorado. Disse que o Aerolula, comprado por US$ 56,7 milhões este ano, "é a cara" de Lula. "É bem moderado e modesto, como o presidente." O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim, não se impressionou. "Disseram que o avião era grande, mas não é lá essas coisas, não. É um avião pequeno."

Na conversa, Severino teria sugerido a Lula que a Funai transfira as terras da Reserva Raposa Serra do Sol para Rondônia e Roraima. O presidente teria concordado.

Logo após a decolagem, a comitiva comemorou o aniversário de 55 anos da primeira-dama, Marisa Letícia. Depois, houve um ato ecumênico. Todos rezaram, de mãos dadas, um Pai-Nosso, até Fernando Henrique, que perdeu a eleição à Prefeitura em 85 por não ter declarado que acreditava em Deus. "Não sei se ele (FHC) rezou, mas ele ficou de pé. Eu acho que ele é católico", disse Severino.

O clima foi formal no começo da viagem, mas depois todos se descontraíram - houve até brincadeiras. Severino provocou risadas quando o acordaram para participar do ato ecumênico. Pensou que estivesse sendo chamado para uma refeição. Agradeceu, dizendo que já havia comido.

No vôo foram servidos seis pratos, entre eles camarão, guisado de bode e frango. Ainda viajaram no Aerolula o chanceler Celso Amorim, o senador José Sarney (PMDB-AP), o secretário-geral da CNBB, d. Odilo Scherer, o arcebispo de Brasília, d. João Áviz, o rabino Henry Sobel, o xeque Armando Hussein Saleh, da Mesquita do Brasil, e o pastor Rolf Schunemann, da Igreja Evangélica da Confissão Luterana no Brasil.