Título: Municípios se rebelam contra emenda que torna creche obrigatória
Autor: Sérgio Gobetti Rosa Costa
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/04/2005, Nacional, p. A14

Texto aprovado pelo Senado, que será votado pela Câmara, obriga prefeituras a garantir educação infantil O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, considera lamentável a decisão do Senado de aprovar a emenda constitucional que obriga as prefeituras a garantir creche e pré-escola para todas as crianças até 6 anos de idade sem definir a fonte de recursos para financiar esse gasto. "Isso é lamentável, porque o Senado deveria ter a responsabilidade de dizer de onde virá o recurso para assumir essa nova atribuição", disse. Para ele, virou um costume no País a aprovação de leis que estabelecem novas atribuições para as prefeituras sem a devida provisão de receitas. "É por isso que as prefeituras estão do jeito que estão, sem conseguir cumprir muitas de suas obrigações e sujeitas a responderem a processos", reclamou anteontem.

A emenda, proposta pela senadora Heloísa Helena (PSOL-AL), modifica o artigo 208 da Constituição e trata como dever do Estado a disponibilidade de creche e pré-escola gratuita para crianças de zero a 6 anos. O governo se opôs à proposta, mas ela passou na terça-feira à noite: foi aprovada nos dois turnos por unanimidade. Agora, ela vai à Câmara e, para ser aprovada, também terá de receber os votos de pelo menos três quintos dos deputados em dois turnos.

Na quinta-feira, da tribuna do Senado, Heloísa Helena acusou o governo de fazer uma campanha contra a emenda entre as prefeituras. "Em entrevista, disseram até que ao implantar a medida os prefeitos incorreriam em crime de responsabilidade", reclamou. "Quem diz isso não é intelectualmente honesto."

Para evitar que o governo obstrua a votação na Câmara, ela se uniu aos líderes no Senado do PFL, José Agripino (RN), e do PSDB, Arthur Virgílio (AM). Eles pedirão ao presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE), que apóie a emenda. Também vão conversar com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ), e os integrantes das comissões que examinarão a proposta. "Estamos nos precavendo contra o terrorismo do governo", disse Heloísa.

"Esta iniciativa beneficiará um grande número de crianças e, portanto, tornará o País mais democrático", argumentou Agripino. Arthur Virgílio acha que, se os defensores da emenda não agirem a tempo, o Planalto vai criar na Câmara o mesmo "clima de rejeição" que só não funcionou no Senado porque a oposição e até senadores da base aliada reagiram. O líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), chegou a apresentar proposta para para protelar a votação, mas não conseguiu o apoio do número mínimo de 27 senadores.

APELO

Heloísa fez um apelo aos governistas para que "deixem a emenda transitar em paz" na Câmara. "Deixem que nossas crianças pobres possam ter aquilo que os filhos dos deputados, dos senadores e dos ricos deste país têm a oportunidade de ter, tirem as patas dos direitos das crianças e ajudem as prefeituras, fazendo aquilo que o governo federal deve e pode fazer", pediu, da tribuna. Segundo ela, dados em poder do próprio governo revelam que somente 7% das crianças de zero a 3 anos têm acesso à creche. A pré-escola atenderia apenas 11% das crianças de 4 a 6 anos.