Título: General francês deu aula de tortura a militares brasileiros
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/04/2005, Nacional, p. A12

Num amplo trabalho de apuração, o juiz espanhol Baltasar Garzon instruiu um processo que permitiu a prisão, em 1999, do general chileno Augusto Pinochet, reunindo provas de atentados aos direitos humanos cometidos pelas ditaduras militares latino-americanas. A revista semanal do jornal Le Monde divulga uma parte desses documentos, relatando as violências praticadas em outros países, como o Brasil, presidido na época pelo general João Figueiredo.

O jornal revela também que o savoir-faire francês em matéria de repressão foi utilizado nos anos 70 graças ao general Paul Aussaresses, ex-adido militar no Brasil, o mesmo que havia passado pela Argélia. Ele é o autor da doutrina segundo a qual todo torturado deve ser eliminado. O mais grave é que o Estado francês sabia do que se passava na América do Sul.

Segundo depoimento do general Manuel Contreras, na época chefe da polícia secreta chilena, a Dina, numerosos oficiais chilenos chegaram a fazer estágio no Brasil, todos eles orientados pelo general francês Paul Aussaresses, coordenador, em 1957, dos serviços de informação da França na Argélia e, posteriormente, em 1973, adido militar no Brasil . Ele é apontado como um dos inspiradores do centro militar de instrução de Manaus, onde foram formados oficiais brasileiros, chilenos e argentinos especializados em repressão e tortura. Também o general argentino Albano Harguideguy, ministro do Interior do regime de Videla, cita a França: "Aprendemos tudo com os franceses." O modelo foi o utilizado na Batalha da Argélia, em 1957, quando da luta dos pára-quedistas franceses contra a Frente de Libertação Nacional (FLN).

O general Aussaresses mora em Paris, mas tem evitado falar após a repercussão negativa de seu livro Argélia, Serviços Especiais, onde defendeu seus métodos de tortura. Militares argentinos e brasileiros, seguindo os conselhos dos franceses, jogavam no mar o corpo das pessoas torturadas até a morte, prática que os franceses haviam desenvolvido na baía de Argel. Para o general francês, "a luta contra a subversão não pode ser desenvolvida através de métodos clássicos".