Título: Um cargo para o filho de Severino, a moeda do Planalto por dias de paz
Autor: Christiane Samarco , João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/04/2005, Nacional, p. A4

José Maurício Cavalcanti, filho do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), assume amanhã a Delegacia Regional do Ministério da Agricultura em seu Estado natal, Pernambuco. Sua posse promete ser uma festa. O pai vai chegar diretamente de Roma, onde assistiu aos funerais do papa João Paulo II como integrante da comitiva oficial brasileira. Viajou no Aerolula, num momento em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva intervém, pessoalmente, para reconstruir sua instável base de sustentação política. Para dar à posse tom mais cerimonioso e, com isso, galantear o PP - ao qual negou o Ministério das Comunicações -, o presidente Lula pediu ao ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, para prestigiá-la. Também estarão presentes à festa o presidente do PP, deputado Pedro Corrêa (PE), e outros parlamentares do partido. "Não escondo o que faço. Quem indicou José Maurício ao governo foi Severino Cavalcanti", confessou o presidente da Câmara, quando lhe perguntaram.

A nomeação de José Maurício parece ter sido a solução para resolver a pendenga entre Lula e Severino, que se arrasta há dois meses. E dá bem a medida da importância que uma nomeação - ainda mais quando brinda um parente - tem nas relações políticas. Por tudo isso, a disputa por cargos entre os partidos da base aliada é cada vez mais feroz.

PMDB X PL

O PMDB acusa o PL de verticalizar a estrutura do Ministério dos Transportes - isto é, só nomear apadrinhados para cargos em comissão -, em particular o Departamento Nacional de Infra-Estrutura em Transportes (DNIT) e as Companhias Docas. Por conta disso, no Ceará o deputado Aníbal Gomes (PMDB) teve um afilhado despejado do DNIT, para dar lugar a um apadrinhado do deputado Almeida de Jesus (PL).

O PMDB irritou-se porque tem cinco deputados cearenses e o PL tem só um, Jesus. O partido acha o despejo uma ofensa ao ministro Eunício Oliveira (Comunicações), que é do PMDB cearense. Os cinco da bancada não se conformam e alegam que havia cargos vagos que podiam saciar a voracidade do PL, como a delegacia da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Aníbal foi derramar lamúrias no Planalto. Como consolo, recebeu a explicação de que não houve intervenção palaciana na troca de cargos no DNIT. Disseram-lhe que a decisão era de responsabilidade exclusiva do ministro Alfredo Nascimento. Aníbal ouviu, por fim, que os ministros devem ter um mínimo de autonomia para nomear e demitir pessoas dos cargos de comissão.

O vice-líder do PL na Câmara, João Leão (BA), contesta o PMDB. "O PL só quer sobreviver e se transformar em um grande partido, na Câmara e no Senado. Aníbal tinha três cargos e agora vai ficar com dois. Almeidinha (Almeida de Jesus) fica com um. Almeidinha sempre vota com o governo, e o Aníbal vota às vezes...", diz Leão.

E inclui em sua explicação a crise do emprego. "Os ânimos estão acirrados na base porque o desemprego é grande demais. Toda família tem um desempregado e todo mundo acha que é o deputado que tem dar jeito nisso", afirma. "Eu mesmo estou pressionado como nunca e não tenho sossego nem em casa, por conta de um cunhado meu, desempregado. Minha mulher quer que eu arrume um emprego de economista para ele de todo jeito, mas não tem emprego para a classe média", desabafa.

Por causa de confusões como a do Ceará, o PMDB se rebelou e convocou o PP para, juntos, irem à luta contra o Planalto. Alguns de seus parlamentares levantam até a suspeita de que a onda de denúncias contra o ministro da Previdência, Romero Jucá, tem remetente certo: seria uma armação de setores do governo, que miram no peemedebista Jucá para enfraquecer o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e abalar a hegemonia do partido na Casa.