Título: É inevitável distribuir cargos, diz líder
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/04/2005, Nacional, p. A5

Mal assumiu a liderança do governo na Câmara, o petista Arlindo Chinaglia (SP) admite ser inevitável a distribuição de cargos e a liberação de emendas de parlamentares para manter o apoio dos partidos aliados ao Palácio do Planalto. Há 15 dias no cargo, Chinaglia considera que não há como pôr projetos importantes na pauta, como a reforma tributária, antes de ter a base reunificada. Em entrevista ao Estado, o petista considera inoportuno o debate sobre a autonomia do Banco Central e reconhece que é "muito difícil" para o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, exercer a articulação do governo sem ter poder de distribuir cargos entre os aliados.

Aos 55 anos, Chinaglia é médico, foi secretário de Governo da ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy, líder da bancada petista e está em seu terceiro mandato de deputado federal. Na minirreforma ministerial feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele chegou à liderança do governo depois de ter sido preterido na escolha do PT como candidato à presidência da Câmara.

Quais são as prioridades do governo na Câmara?

Não há prioridade maior do que reorganizar a base aliada. As prioridades do governo são determinadas pelas circunstâncias e, a curto prazo, temos uma das questões mais relevantes para o Brasil que é a reforma tributária.

A desarrumação da base aliada é reflexo da reforma ministerial?

O que provou de maneira inequívoca a desarticulação do governo na Câmara foi a derrota na eleição da Mesa. Não significa que o governo é o responsável. Quando falo desarticulação, incluo a bancada do PT, da qual eu era líder, e incluo os demais partidos, além de um brutal erro de avaliação. É que o tempo todo se acreditou que nós ganharíamos a presidência. Na hora em que fomos derrotados, quebrou-se uma tradição sei lá de quantas décadas. É o retrato mais contundente da nossa desarticulação política.

A maneira mais eficiente de fazer política é com a liberação de emendas e nomeações para cargos?

Não acho a melhor, mas é inevitável. Quando a gente virou governo, comecei a me deparar com demandas. Isso levou a própria bancada do PT a ter de ficar correndo atrás de resolver problemas. Prefeitos de outros partidos procuram deputados do PT ou de partidos da base aliada porque têm uma questão concreta para resolver. Quando se fala em nomear alguém, não é necessariamente o fisiológico. É porque os deputados querem ver alguém numa determinada estrutura que tem capilaridade e ele pode telefonar para aquele sujeito e pedir para resolver determinado problema.

As denúncias contra o ministro da Previdência, Romero Jucá, causam desconforto ao governo?

É desconfortável inclusive para ele. Se um ministro, um deputado, qualquer dirigente, qualquer homem público, em um dado momento se estabelece uma polêmica em função de uma dúvida, acho que sempre caminhará para um desfecho. E qual é o desfecho? A hora em que se estabelecer a verdade. Qualquer um tem de ter o benefício da dúvida. O dever coletivo é fazer a verdade vir à tona.

Qual a opinião do senhor sobre a autonomia do Banco Central?

Na minha opinião, não creio que seja um debate oportuno. No momento em que a economia vai bem, o noticiário internacional é favorável ao País, há geração de emprego, vários programas sociais em andamento e nós estamos com dificuldades políticas, por que dar mais um elemento desses? Se eu for ouvido, vou dizer para tirar da pauta. Quando se fala em autonomia do Banco Central tem gente do PT que defende isso, tem gente que é contra. No governo é a mesma coisa. O que ajudaria trazer um tema destes? Agora é inoportuno. Nunca foi um tema fácil. Mas agora estamos não só constando mas também confessando que estamos com dificuldades políticas.

É possível fazer coordenação política sem ter na mão o instrumento dos cargos para resolver os problemas da base?

Fica muito mais difícil. Quando se fala da coordenação política, entendo a função hoje exercida pelo ministro Aldo Rebelo. Não falo apenas de cargos ou de emendas ou de qualquer coisa dessa natureza. Vou pegar três ministérios que têm grande, profunda capilaridade: Saúde, Integração Regional e Cidades. Estes ministérios têm muito mais poder objetivo do que a coordenação política. Cabe à coordenação política coordenar esses ministérios e todos os demais de maneira combinada para que a coordenação política de fato se exerça.

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, como coordenador do governo acaba tomando as decisões?

É evidente. Não é o ministro José Dirceu; é a Casa Civil. Porque a Casa Civil, institucionalmente, tem o papel de coordenar o governo. Vou buscar me relacionar institucionalmente com todos os ministros. Quando tiver uma dúvida de qual é a posição do governo vou saber da Casa Civil. Vou alertar o ministro Aldo. Mas vamos imaginar que a coisa arraste, não resolva e fique na pauta. Vou pedir para o Zé Dirceu me dar a posição do governo. Mas não tem disputa. É porque é institucional que a Casa Civil fale a posição do governo. São funções diferentes. Não entro na lógica de que o governo está dividido, de que um manda mais do que o outro, de que um quer derrubar o outro. Se eu entrar por aí mereço ser fuzilado politicamente. Vou trabalhar com todos. Todos têm valor.