Título: Para Severino, estupro é um acidente e criança tem de nascer
Autor: Arthur Guimarães
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/05/2005, Nacional, p. A7

Presidente da Câmara declara que casou "mais ou menos virgem" e faz defesa velada da prostituição Com o argumento de que "a mãe que tem seu filho sempre é feliz", o presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE), alegou ontem ser contra o aborto em caso de estupro. Apesar de ter usado frases que, muitas vezes, pecavam pela carência de seqüência lógica, o parlamentar deixou claro o seu ponto de vista sobre o assunto: "Se houve o estupro, ela quis que essa criança permanecesse. Essa criança tem que nascer. Precisa ser criada com carinho e amor da mãe, mesmo que isso tenha sido causado por esse acidente horrendo". O deputado simplificou em uma frase como deveria ser o procedimento para diminuir o trauma da mãe durante a gestação: "Deve ter a ação dos familiares para que ela possa sentir que não é uma pessoa marcada".

Sobre a pena para o estuprador, Severino foi enfático. "Deveria ter a pena de morte. Como eu sou cristão, não admito a pena de morte. Mas o estuprador deve ter o pior castigo. Não merece o menor respeito da sociedade", pregou o presidente da Câmara dos Deputados.

Mais tarde, depois de alegar que política e religião devem caminhar juntas - em nome da fé -, o presidente da Câmara também defendeu a abstinência sexual antes do casamento. "Eu fiz isso. Era um homem puro e casei com a melhor mulher que poderia ter", explicou.

Questionado se a frase indicaria que ele teria se casado virgem, o parlamentar foi irônico. "Casei mais ou menos virgem." Na seqüência, indagado se o voto de castidade valeria então apenas para as mulheres, o presidente da Câmara assumiu: "A mulher tem de casar virgem. O homem quer aprender como fazer o serviço e vai aprender com quem estiver disposta a ser professora".

Severino também falou ontem sobre outros temas polêmicos. Disse que não acha certo infringir a lei, mas "oferece as facilidades da lei para os amigos"; declarou que o deputado federal brasileiro tem um "salário pequeno em relação à responsabilidade" do cargo; alfinetou o presidente Lula dizendo que, se o governo "continuar com essa desorganização, será difícil sustentar a reeleição"; e adiantou que disputará a eleição para deputado federal em 2006.

Severino mostrou incoerência quando falou sobre as vaias que recebeu no domingo, na festa de 1.º de Maio da Força Sindical, em São Paulo.

Primeiramente, o deputado tirou o corpo fora. "As vaias foram para a Câmara. Mas tinha gente que falava 'continue Severino, eu quero você como é, não aceite pressão dos jornalistas'. De todo jeito, vou levar o recado para os deputados."

Em um segundo momento, Severino alegou que tinha entendido que as vaias, na verdade, eram aplausos. Segundo ele, só acabou descobrindo que era realmente uma manifestação de reprovação ao abrir os jornais de ontem.

As declarações foram dadas em sabatina organizada pelo jornal Folha de S. Paulo, na tarde de ontem, evento que contou com a participação de autoridades como o ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf (PP). Ao final da entrevista, quando comemorava o seu desempenho, o deputado disse ao microfone: "Nem fui vaiado". A platéia, em resposta, prontamente começou a vaiar o parlamentar, que ainda teve outro compromisso, na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, no Centro .