Título: O 'recado de Manari¿
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2005, Notas & Informações, p. A3

"Este é o recado de Manari: faça reforma agrária que o País não terá mais fome." Quem manda o recado é o líder regional do Movimento dos Sem-Terra (MST) Jaime Amorim, depois de pesquisar e descobrir que o município detentor do menor Índice de Desenvolvimento Humano do País seria o local ideal para a montagem do evento periódico maior dos movimentos "sociais" ligados à terra, já há alguns anos batizado de "Abril Vermelho", que tem por objetivo maior fazer grandes, simultâneas e espetaculares ocupações de propriedades, mobilizando para tanto milhares de "militantes".

Para a realização do "Abril Vermelho" em curso, que com a ocupação de mais 3 áreas em Pernambuco já atinge 13 propriedades, o MST mobilizou 4 mil sem-terra. Foi buscá-los na periferia de uma cidade de 13 mil habitantes, e como estes, que nunca trabalharam no campo, não têm idéia alguma do que seja o MST, com todo o seu "ideário" político-ideológico, tiveram que ser submetidos a um esforço concentrado de catequese, sob a promessa do recebimento de uma cesta básica mensal e da conquista de um pedaço de terra em um ano. Nesse recrutamento e nessa pregação doutrinária os dirigentes do movimento se utilizam de todos os meios de motivação dos novos integrantes, tais como a repetição vibrante de slogans, do tipo "ocupar, resistir, produzir", a entoação de cânticos e coisas do gênero, mas sobretudo de promessas - às quais o líder Amorim não tem receio algum de frustrar, como explicou: "A frustração da expectativa original faz parte do processo de luta."

Quer dizer, pouco importa se a esperança, o sonho de se tornar proprietário de terra para trabalhar e produzir, com que procuram envolver uma população carente, sem experiência de trabalho do campo, venha a se tornar uma dolorosa frustração, pois o que interessa ao MST e movimentos assemelhados é tão-só arregimentar um bando enorme de figurantes para montagem de seu espetáculo das ocupações simultâneas do "Abril Vermelho". E dentro desse marketing também não importa se as ocupações são reais ou "fajutas", como a que foi anunciada, em Pernambuco, como "a maior ocupação já realizada pelo movimento no Estado" - que seria a da Fazenda Lagoa, invadida por 2 mil pessoas - que na realidade não passou de uma área de um hectare, alugada por R$ 600,00 anuais por um fazendeiro e oferecida em negociação ao MST, com o objetivo de livrar-se de seus invasores. Seria uma espécie de pagamento de "pedágio" ou "proteção", nos moldes das negociações de donos de estabelecimentos comerciais com organizações mafiosas, como na Chicago dos anos 30.

Mas indaguemos: a quem é dirigido esse "recado de Manari", transmitido pelo líder regional do MST Jaime Amorim? A quem é dada essa fórmula, indicada como exclusiva para acabar com a fome no País? Ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é claro. É como se o presidente da República e todos os seus assessores, que tanto alarde fizeram em torno do Programa Fome Zero, não tivessem idéia alguma da melhor forma de combater a fome no País. Daí que, a nova edição do "Abril Vermelho", comunicada por meio do percuciente "recado de Manari", viria preencher a grave lacuna governamental.

Há que se admitir, por outro lado, que o governo Lula está efetivamente descumprindo as promessas que fez, quanto ao número de assentamentos programados - e o ministro Rossetto, encarregado da reforma agrária, é o primeiro a admitir o descompasso entre o prometido e o realizado. E certamente, no caso, não lhe seria tão fácil repetir a non chalance do líder emessetista Jaime Amorim, dizendo que "a frustração da expectativa original faz parte do processo de luta". Já haveria aí motivo suficiente - afora outros, de natureza financeira, ética, legal, criminal - para se aproveitar a quebra de sigilo das cooperativas ligadas ao MST (já que esta entidade não tem existência legal), determinada pala CPI da Terra (junto com a quebra de sigilo também da UDR), para se conhecer todo o fluxo de recursos públicos destinados aos assentamentos, dentro do programa governamental da Reforma Agrária, porquanto há denúncias e indícios substanciais de desvios, de tais recursos, para operações de invasão. Os maiores interessados em apurações desse gênero não deveriam ser o presidente da República, seu governo e seu partido?