Título: Sem juiz, delegado, padre nem celular
Autor: José Maria Tomazela
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/04/2005, Metrópole, p. C1

Borá não tem juiz nem delegado nem mesmo um padre à disposição dos fiéis de Santo Antônio, o padroeiro do município. Quando é preciso, o padre vem de Paraguaçu, o delegado, de Tupã. Não há hotel nem pousada. As duas escolas comportam apenas os 230 alunos locais, mas ainda não têm uma biblioteca - apenas o espaço, sem os livros. O sinal de telefone celular não chega. "Como vamos atender a essa invasão que vem chegando?", pergunta o vereador Celso Soares, do PMDB. Por ser uma cidade pacata ainda hoje, os moradores não sentem falta de uma estrutura maior. "Agora, vamos perder a tranqüilidade."

Soares sabe que a economia vai melhorar, mas tudo tem um preço, diz. "Durmo com a porta aberta e deixo a bicicleta na rua, mas ninguém mexe. Isso está acabando."

Para o jardineiro Isaías Lima dos Santos, de 36 anos, a usina está trazendo progresso. "Vem gente boa e gente ruim, mas, se for pensar nisso, a cidade não cresce", diz. O pedreiro José Aparecido Albertini, de 39 anos, afirma que a usina caiu do céu, porque tem um filho de 17 anos que logo vai precisar arranjar trabalho. "Sossego, aqui, já cansou."

O presidente da Câmara, João Antonio Néspoli (PSDB), diz que, apesar do impacto que está causando, a chegada da usina é unanimidade na cidade. "Se fizer um plebiscito, ela ganha estourado." O tucano garante que os moradores não ficarão sem segurança. "Se for preciso, instalamos câmeras, como nas outras cidades."

O prefeito Nelson Celestino Teixeira (PSDB) acha que a receita da prefeitura, de R$ 260 mil mensais, vai dobrar. "Hoje, só 20% representam receita própria, o resto é repasse."

Por isso, o crescimento rápido não o assusta. "Estou fazendo mais duas salas de aulas e ampliando o Centro de Saúde." A unidade dispõe de quatro ambulâncias, três médicos e dois dentistas. A iniciativa privada também está investindo. "Estão saindo dois loteamentos."

O prefeito conta que, desde a chegada da usina, as terras se valorizaram. "O alqueire custava R$ 8 mil, agora falam em R$ 20 mil." Muitos sitiantes arrendaram áreas para o cultivo de cana-de-açúcar. "O dinheiro entra na conta todo mês, como se fosse salário."

Na única agência bancária da cidade, do Banespa, o número de contas dobrou. Mas a criminalidade ainda não cresceu, segundo a Polícia Militar. A cadeia local não tem presos. Desde que Borá se tornou município, em 1965, há notícia de apenas um homicídio, ocorrido no ano passado. Foi um crime passional: após ser abandonado pela mulher, um morador - justamente o filho do prefeito - matou o rival com um tiro.

MORADIA

Para comportar a chegada dos novos moradores, a prefeitura inicia em maio a construção do primeiro módulo de 50 casas de um conjunto habitacional que terá 150 moradias. "Considerando que temos hoje 270 casas, o tamanho da cidade já vai quase dobrar", diz o prefeito.

O município tinha R$ 70 mil para comprar o terreno, mas a verba era insuficiente. "Falei com os donos da usina e eles entraram com mais R$ 50 mil." A construção será feita pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), do governo do Estado.

A seleção promete ser trabalhosa. Na primeira fase de inscrição, já são seis famílias disputando cada imóvel.