Título: Dirceu diz que reeleição de Lula não está garantida e pede ajuda ao PT
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2005, Nacional, p. A4

Em duas conversas reservadas com petistas, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, afirmou que a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006, não está garantida. Em tom de advertência, o ministro pediu desprendimento aos companheiros para que aceitem a coligação com o PMDB nos Estados, mesmo se for necessário sacrificar candidaturas do PT, em nome do projeto nacional para reconduzir Lula à Presidência. O apelo de Dirceu foi feito no sábado, no Rio, em reunião a portas fechadas do campo majoritário - que abriga as alas moderadas do PT -, depois do aval dado ao documento "Bases de um Projeto para o Brasil", incorporando a ortodoxia econômica do governo ao ideário do partido. À vontade diante de companheiros do partido que presidiu de 1995 a 2002, Dirceu foi franco: disse que Lula não concorrerá a um segundo mandato se a candidatura não for sustentada por uma ampla aliança de centro-esquerda, envolvendo até setores da direita.

"Não se surpreendam se Lula não for candidato", afirmou o ministro, de acordo com relatos de petistas que participaram do encontro. "Por que ele disputaria uma eleição? Só se houver chance de vitória." Dirceu culpou o próprio PT pelas dificuldades criadas para fechar as alianças.

Sem esconder a preocupação, o chefe da Casa Civil disse que o cenário político só não está pior para o PT porque o PSDB e o PFL - principais adversários do partido - estão "muito mal". Apontou como sintoma dessa fragilidade o ressurgimento da pré-candidatura de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) à sucessão de Lula. Mais: afirmou que o prefeito do Rio, César Maia (PFL), outro presidenciável, está liquidado depois da intervenção federal nos hospitais.

No debate, alguns petistas reclamaram da insistência do PT em firmar uma parceria mais sólida com os peemedebistas a qualquer preço, sob a alegação de que o PMDB é inimigo em vários Estados, tem muitas facções e, além de tudo, não é confiável. Um dos queixosos foi do Rio Grande do Sul, onde o PMDB exige que o PT apóie a chapa do governador Germano Rigotto à reeleição, caso seja fechada a coligação nacional. Quando questionado em que Estados o PT deveria abrir mão das candidaturas, Dirceu desconversou. "Isso é com o presidente do PT, José Genoino", respondeu.

CÁLICE

Logo no primeiro dos dois dias da pajelança petista - que terminou ontem com a aclamação de Genoino como candidato à reeleição no comando do PT -, Dirceu garantiu que não quer a cadeira do ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, do PC do B. "Eu não quero a articulação política. Afasta de mim esse cálice!", exclamou ele, como publicou o Estado na edição de ontem.

Mesmo isentando Aldo de culpa pelos percalços enfrentados na articulação com o Congresso, Dirceu recorreu à ironia para tratar do assunto. Lembrou que o PC do B de Aldo é um aliado com nove deputados federais. "Está certo que só cinco votam com a gente, mas não tem problema", provocou.

JUROS

Ao defender o documento do PT que considera o equilíbrio fiscal peça estratégica para alcançar o desenvolvimento, o ministro justificou a alta dos juros com o argumento do controle da inflação. Disse que os juros poderiam ser mais baixos, mas lembrou que o Banco Central tem autonomia. "Não nos iludamos. Nem o Lula nem o Palocci mandam no Banco Central", comentou, numa referência ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Depois, não quis falar sobre o assunto alegando que Palocci não estava mais presente.

Na prática, Dirceu e Palocci fizeram um pacto para apagar focos de incêndio no campo majoritário, dividido por quedas-de-braço, divergências em relação às alianças e - até a trégua entre os dois - pela disputa dentro do governo. Por isso, em todas as intervenções no debate com os petistas, Dirceu defendeu a política econômica conduzida por Palocci.

Ao lado dos juros e do tamanho do superávit primário - economia de gastos para pagamento da dívida -, a autonomia do BC é um dos temas que mais causam polêmica no governo e no PT. Tanto que nem constou do texto aprovado pelo campo majoritário. "De qualquer forma, o PT não deve se ater nas discussões desses indicadores, mas, sim, apontar desafios para o futuro", insistiu Palocci, que combinou o discurso com Dirceu.