Título: Scola, o cardeal acadêmico
Autor: Ricardo Westin
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/04/2005, Vida&, p. A15

Aos 63 anos de idade, o cardeal Angelo Scola ainda tenta superar o estigma de religioso acadêmico que não consegue manter contato direto com os fiéis. De fato, esse candidato italiano ao lugar deixado pelo papa João Paulo II não tem grande experiência em pregações. Ordenado padre em 1970, ele passou os 20 anos que se seguiram praticamente trancado em bibliotecas de universidades católicas da Itália e da Suíça, de onde saiu doutor em filosofia e teologia. Conseguiu voltar para a academia em 1995, para ser reitor da Pontifícia Universidade Lateranense de Roma.

A experiência como pregador está praticamente restrita ao curto período em que foi bispo de uma diocese do interior da Itália, no início dos anos 1990, e ao cargo de arcebispo-patriarca de Veneza, o qual ocupa desde 2002. Como a relação próxima com os fiéis não soma mais que dez anos, ele ainda é descrito como preso ao pensamento intelectual da religião.

Os sermões e os textos de Scola - que fala várias línguas - costumam ser elaborados após longas pesquisas e são considerados de difícil compreensão em razão da recorrente terminologia teológica e filosófica. Numa entrevista recente, ele reconheceu que não é fácil traduzir os argumentos da religião para a prática dos fiéis: "Nós, cristãos, normalmente propomos a moralidade sem dar razões, sem convencer. A fraqueza é nossa".

Ao ser ordenado patriarca de Veneza, ele propôs criar na cidade uma espécie de universidade que teria como objetivo fortalecer a identidade católica.

Tamanha preocupação com o mundo acadêmico revela um cardeal moderado e conservador - alinhado, portanto, com as idéias de João Paulo II. Ele tem a mesma opinião em relação ao papel da mulher na Igreja: "A Igreja não tem o poder de mudar essa prática que tem 2 mil anos, de chamar apenas homens para pregar".

O entrosamento entre os dois fez com que o papa nomeasse o cardeal reitor da Universidade Lateranense, relator-geral da próxima assembléia do Sínodo dos Bispos, marcada para outubro deste ano, e membro do Conselho Pontifício para a Família. Também une Scola e João Paulo II a defesa do diálogo entre cristãos e muçulmanos.

Veneza, a cidade onde Scola é arcebispo, trouxe para a Igreja três papas só no século passado: Pio X (1903-14), João XXIII (1958-63) e João Paulo I (1978).