Título: Crimes lembram 'O Nome da Rosa'
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/04/2005, Metrópole, p. C1

A Paróquia Bom Jesus, no bairro pobre do Novo Mundo, fica a três quilômetros do Estádio Serra Dourada, onde em 1991 o papa João Paulo II celebrou uma missa para milhares de fiéis, num altar feito à semelhança do cocar de um índio. É muito simples. Fica numa praça, onde termina a linha de ônibus do Novo Mundo. Do outro lado um templo da Assembléia de Deus disputa os fiéis. Embora em nada se pareça com a abadia onde se passa O Nome da Rosa, de Umberto Eco, as mortes dos padres lembram o romance. Dos que comandavam a Paróquia Bom Jesus, dois foram mortos em dois anos; na abadia de Eco, sete padres foram assassinados em sete dias. Na Bom Jesus, a polícia ainda não conseguiu pistas definitivas sobre os assassinos ou as perdeu definitivamente com as mortes; na abadia do Nome da Rosa, o padre franciscano William de Baskerville e seu assistente Adso de Melk decifram tudo o que vinha acontecendo. Cada um dos mortos tinha seu medo e suas implicações nos casos.

Hoje a Paróquia Bom Jesus é comandada pelo padre Donizeth, que a assumiu há dois meses. A arquidiocese lhe impôs a obrigação do silêncio sobre o caso dos assassinatos. Além do mais, ele está traumatizado com as histórias que ouviu ou leu. E sabe que ainda pode ser procurado por investigadores da polícia. Ele diz, no entanto, que o rebanho começa a voltar. "Só posso dizer que as coisas estão melhorando e que a igreja voltou a ser bem freqüentada", garante.

A paróquia tem uma escola de informática para carentes e um centro de recuperação de alcoólatras. A igreja, erguida pelo padre Bernardino com a contribuição dos fiéis, tem 96 bancos de madeira. Nas paredes estão pequenos quadros com a via-crúcis, que narram os últimos momentos da vida de Jesus Cristo.

Num grande cartaz, logo na entrada, há a informação de que no mês de março 325 pessoas pagaram o dízimo, que somou R$ 7.037,10. As ofertas anônimas chegaram a R$ 1.796,59. Esse aviso é um cuidado do pároco atual, já que o antecessor, padre Bernardino, era suspeito de desviar o dinheiro da igreja.

Padre Donizeth atribui tudo o que foi feito na paróquia ao empenho de Bernardino, embora evite fazer qualquer juízo de valor a respeito do sacerdote que comandou por tanto tempo a paróquia e acabou se envolvendo em uma história de amor com um aluno. Foi apontado como suspeito de assassinato, tendo ficado preso por dez dias e, posteriormente, morto em circunstâncias tão misteriosas que até hoje o carro em que estava, um Santana, continua desaparecido.

Jaqueline, de 19 anos, batizada pelo padre Moacir Bernardino, diz que até hoje não entende direito o que aconteceu. Como outras pessoas da vizinhança, afirma que tudo parece um pesadelo. "Conheci muito o padre Bernardino. Isso tudo é muito triste."