Título: Brasil e EUA vão retomar Alca
Autor: Reali Júnior
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/05/2005, Economia, p. B4

Durante pouco mais de uma hora, o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, e o representante do Comércio dos Estados Unidos, Robert Portman, tiveram uma conversa franca, mas prudente, na expectativa de uma evolução favorável das negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC), cujo objetivo é a conclusão da Rodada Doha, que permanece bloqueada. Mas se decidiu, também, pela retomada das negociações da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Ontem, na reunião entre altos funcionários do G-5, não se constatou nenhum avanço na negociação sobre Doha, mas sim uma estagnação e até uma volta atrás em alguns progressos alcançados anteriormente, destacou o embaixador Clodoaldo Hugueney.

Hoje, na Embaixada do Brasil, haverá reunião do G-20, mas não se espera nenhuma grande evolução em relação ao aspecto principal da negociação, que seria o restabelecimento de critérios e fórmulas de conversão de tarifas específicas para tarifas "ad valorem" no setor agrícola, que tem envenenado as conversas entre os países.

Por isso, no encontro com Robert Portman, Celso Amorim procurou destacar dois temas - o das negociações da OMC e da Alca -, convencido de "que vivemos um momento muito importante de decisões, mas admitindo que, com esse debate da conversão tarifária, assistimos à politização de um tema técnico".

Segundo o chanceler brasileiro, alguns países procuram manter seus subsídios aproveitando o problema das tarifas específicas - um obstáculo que precisa ser rapidamente removido. "A agricultura continua sendo o motor, mas sem o motor para o debate não pode evoluir para outros setores", acrescentou.

ALCA

No encontro com Portman, uma das decisões tomadas foi a de levar adiante as negociações da Alca, tendo o funcionário americano prometido examinar os itens citados por Amorim, e ambos dispostos a procurar uma saída para restabelecer a negociação, sem precipitação, a partir do acordo de Miami.

Isso porque, na análise do ministro brasileiro, as coisas passaram a não andar no momento em que se procurou um maior distanciamento do acordo de Miami e as atenções se concentraram nas negociações da OMC. Os dois decidiram dar um novo impulso, "uma nova energia ao processo da Alca". Para Celso Amorim, "só uma forte dose de realismo pode mudar para melhor".

Indagado se a conversa com Portman foi mais fácil do que com o seu antecessor, o subsecretário de Estado, Robert Zoellick, o ministro brasileiro disse apenas: "Um está entrando e o outro estava saindo..."

VOTO ASSUMIDO

Amorim acabou admitindo ontem que o Brasil vai apoiar o candidato latino-americano para a direção geral da OMC, o uruguaio Perez del Castillo, ao afirmar que "é difícil para o Brasil votar contra um candidato latino-americano".

Perez del Castillo lançou sua candidatura, sofreu forte pressão do Itamaraty para retirá-la, mas não cedeu e a manteve até o fim, e agora disputa a posição com o francês Pascal Lamy, o favorito na disputa. O Brasil chegou a lançar a candidatura de seu embaixador em Genebra, Luiz Felipe Seixas Correa, mas não obteve apoio suficiente dos países do Terceiro Mundo e latino-americanos, e foi obrigado a retirá-la por falta de condições.

Até ontem, o ministro Amorim, quando questionado sobre o assunto, dizia que ainda tinha tempo para dar sua resposta. Mas ontem, em Paris, decidiu abrir o jogo, anunciando como inevitável o apoio à candidatura latino-americana.