Título: Chávez radicaliza discurso e gestão
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2005, Internacional, p. A13

Oposição venezuelana vive um dos piores períodos desde a derrota no referendo de agosto sobre o futuro do presidente CARACAS - Um Hugo Chávez triunfante declarou ontem a centenas de milhares de venezuelanos, reunidos para a celebração do 1.º de Maio, que "dentro do modelo capitalista é impossível alcançar as metas da nossa Constituição e do nosso projeto político", "não há nenhuma forma de dar um rosto humano ao capitalismo", e "não existe modelo intermediário entre o capitalismo e o socialismo". Em tom de troça, acrescentou que o "capitalismo é pior que o Conde Drácula, Frankstein e Jack, o estripador". Recém-chegado de uma viagem a Cuba, onde firmou mais de 50 acordos, Chávez saboreia um dos seus momentos mais poderosos desde que chegou ao poder, há seis anos. E aproveita para radicalizar o seu discurso e sua gestão.

O 1.º de Maio indicou que a oposição vive um dos seus piores períodos desde que foi derrotada no plebiscito sobre a permanência ou não de Chávez, em agosto. (Ler sobre o 1.º de Maio no Brasil e no mundo nas págs. A4, A5 e A6.)

Às 10 horas, na Praça Morelos, mal dava para perceber que uma passeata da oposição estava prestes a sair. Um quadro totalmente diferente descortinava-se às 10h30 na Praça La Bandera, ponto de concentração da passeata pró-Chavez. O mar de gente estava animadíssimo. Carros de som tocavam música "revolucionária", jovens dançavam e oradores lançavam brados de desafio aos EUA.

Por volta das 13 horas, a marcha da oposição já estava praticamente encerrada, enquanto uma enorme multidão de chavistas aglomerava-se em um trecho da Avenida Urdaneta, na qual um grande palanque - de onde uma banda tocava - punha um ponto final à marcha.

"Vim para apoiar o projeto político do nosso líder máximo, Hugo Rafael Chávez Frias", disse, entre pomposa e eufórica, a advogada Eva Donne, 25 anos, uma das centenas de milhares de manifestantes pró-Chávez, que trabalha numa entidade financeira estatal. "Os EUA que não se metam com a Venezuela", acrescentou.

Osvaldo Vera, coordenador da União Nacional dos Trabalhadores (UNT), central sindical chavista, calculou em mais de 1 milhão o número de venezuelanos na marcha pró-Chavez.

"As pessoas se intimidaram com a possibilidade de conflitos entre as duas marchas", disse Trino Figarella, professor de 39 anos, que seguiu a passeata opositora, para justificar o baixo comparecimento.

Às 14h30, Chávez subiu ao palanque cantando e foi recebido com delírio pela multidão. Atrás do presidente e de seus assessores, um enorme cartaz anunciava "Co-gestão é Revolução - Trabalhadores Construindo o Socialismo Bolivariano". Aproveitando o 1.º de Maio, a UNT apresentou ao presidente uma proposta de projeto de lei de autogestão e co-gestão das empresas.

Com o petróleo em torno de US$ 50 o barril, e tendo garantido para si o controle total da Petróleos de Venezuela (PDVSA) e do caixa da bilionária estatal venezuelana, Chávez está pisando no acelerador do que chama de "transição revolucionária para o socialismo do século 21". Chávez está investindo pesadamente em programas de saúde nas favelas. Na área de educação, lançou "missões" (a conotação é militar) para erradicar o analfabetismo, pôr todas as crianças na escola primária, e ampliar o acesso ao secundário e à universidade.

Na economia, Chávez vem estimulando o crescimento das cooperativas, controlando preços e salários. Com Fidel Castro, lançou a quixotesca proposta da Alternativa Bolivariana das Américas (Alba), para se opor à Área de Livre Comércio das Américas (Alca), e na semana passada tabelou juros e tarifas bancárias.