Título: Fim dos mitos no ensino de inglês
Autor: Renata Cafardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2005, Vida&, p. A15

Professor nativo, proibição de explicações em português: educadores derrubam métodos ditos eficientes Professor nativo ensina melhor o inglês. É proibido mencionar qualquer palavra em português durante a aula. O essencial é aprender a falar e não a ler ou escrever na língua. Errado, errado e errado. Educadores e pesquisadores dizem agora que o importante é que o inglês passe a fazer parte da realidade de cada aluno. Não existe o melhor e único método para aprender a língua, estudada por mais de 1 bilhão de pessoas no mundo. "Não adianta chegar à periferia de São Paulo e pedir para a criança repetir um diálogo de quem chega ao aeroporto de Londres", diz Maria Antonieta Alba Celani, educadora da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e representante da América Latina na Tesol International Research Foundation (Tirf), entidade que financia pesquisas sobre ensino do inglês em todo o mundo. Segundo ela, a maioria dos professores enfoca a aprendizagem na estrutura da língua - tempos verbais, gramática, etc. -, em vez de mostrar como ela pode ser usada. "Não é preciso olhar para a língua e sim para o que fazer com ela."

Na semana passada, 60 educadores discutiram na capital a importância do ensino de inglês em um simpósio internacional promovido pela Tirf. "Aprender inglês não é impor a cultura de outro país e sim proporcionar um tour pelo mundo com base na sua própria realidade", disse o africano Koffi Edoh, consultor do Banco Mundial e membro da Tirf. Do total de pessoas que estudam inglês atualmente, 750 milhões o fazem como segunda língua, segundo dados mundiais mais recentes do Conselho Britânico.

Uma das maneiras de trazer a língua para perto de crianças carentes é a possibilidade de uma melhor compreensão do conteúdo da internet. "Os governos falam muito de inclusão digital, mas não adianta botar máquina se os alunos estão restritos na navegação, já que há muitos textos em inglês", diz o professor de pós-graduação de Lingüística Aplicada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Luiz Paulo da Moita Lopes. "São as vítimas da exclusão lingüística. Eles ficam fora do processo de globalização e assim é difícil criar um pensamento crítico sobre o mundo", completa. Segundo ele, o aprendizado da leitura e da escrita em inglês - mais do que a chamada conversação - é o fundamental para alunos carentes.

A disciplina de língua estrangeira, seja inglês, espanhol ou qualquer outra, tornou-se obrigatória nas escolas do País apenas em 1996 com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Ela começa na 5.ª série e vai até o fim do ensino médio. A maioria das escolas opta pelo inglês, mas não há material didático distribuído pelo Ministério da Educação (MEC), como ocorre com as outras disciplinas, nem professores bem capacitados.

Segundo a educadora Maria Antonieta, a maioria se forma em Licenciatura Português/Inglês, freqüentando cursos que focam na formação da língua materna e oferecem pouca prática na língua estrangeira. Ao chegar às escolas, muitos ainda usam métodos ultrapassados de ensino. "É o famoso 'repeat after me', em que não é preciso entender e sim repetir para fixar a estrutura. É por isso que se diz que não se aprende inglês na escola."

Também vice-presidente da Cultura Inglesa, Maria Antonieta coordena um projeto de formação de professores na rede estadual de ensino e acredita que faltam políticas públicas para melhorar o ensino do inglês. O MEC afirma que não há dinheiro para oferecer material didático, embora a disciplina seja valorizada pelo governo.

Desde 2001, a ONG Meninos do Morumbi, numa parceria com a Cultura Inglesa, oferece cursos de línguas para crianças e jovens carentes. "O inglês para essa população não é a promessa de um futuro bonito. Então era preciso torná-lo prazeroso, mostrar o porquê daquilo", diz o diretor-presidente, Flávio Pimenta. A ONG, especializada na formação em música e artes para carentes, passou a organizar viagens ao exterior para apresentações dos grupos. Foi pela possibilidade de conhecer outros países que muitos passaram a se interessar pelas aulas de inglês, diz Pimenta.

"A palavra de que mais gosto é play (tocar)", diz Adelmo Ferreira, de 18 anos, que faz o curso na ONG. Ele conta, orgulhoso, que os pais - uma dona de casa e um mestre-de-obras - pedem a ele para traduzir músicas americanas que tocam no rádio.

FLUÊNCIA

Os especialistas apontam problemas não apenas no ensino público. "Há muitos mitos ligados aos métodos de ensino", diz Maria Antonieta. A fluência do professor é um deles. Ela afirma que o nativo, por exemplo, não é necessariamente o melhor para ensinar inglês. "Se ele não tiver uma formação de professor, não dará conta de todas as questões envolvidas na aprendizagem da segunda língua. Muitas vezes, ele nem sabe falar outra língua e isso dificulta sua percepção do assunto."

A obrigatoriedade de explicações apenas em inglês durante as aulas, segundo ela, fazem que o professor perca tempo. "Não há problema algum em traduzir uma palavra ou outra."