Título: Procurador diz que havia como se livrar da suspeita
Autor: Christiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/04/2005, Nacional, p. A10

Autor do pedido de investigação sobre suposta cobrança de propinas e desvios de recursos federais envolvendo o prefeito de Cantá (RR), Paulo de Souza Peixoto, conhecido por Cão Pelado, e um empreiteiro, o procurador da República Carlos Fernando Mazzoco disse que o ministro da Previdência, Romero Jucá, tinha um caminho jurídico seguro para evitar as suspeitas que rondam seu nome. "Ele poderia ter entrado com um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal pedindo que o inquérito fosse trancado", diz Mazzoco. Segundo ele, bastaria o ministro ter demonstrado que o surgimento de seu nome na gravação era infundado e o inquérito seria trancado no STF. O foco das investigações voltaria para Cantá e a polícia passaria a apurar apenas a suspeita em torno do prefeito e dos outros envolvidos. Mazzoco diz que, em vez do recurso jurídico, Jucá preferiu atacá-lo.

Num pronunciamento da tribuna do Senado, em abril do ano passado, o ministro o chamou de "leviano e irresponsável" e, como retaliação, ainda prometeu que moveria uma ação contra o Ministério Público Federal e a União e ainda apresentaria uma emenda constitucional repassando para o orçamento da Procuradoria da República, e não mais para a União, as despesas processuais dos casos envolvendo procuradores.

O pronunciamento de Jucá ocorreu no dia 7 de abril. Nele, o senador admite que é responsável por convênios que resultaram na transferência de R$ 6 milhões para Cantá, mas garante que todas as obras foram executadas e fiscalizadas por órgãos federais que liberaram os recursos.

"Tudo o que fiz foi no exercício da profissão. O Supremo não só concordou com a investigação como decretou o segredo de justiça que pedi no inquérito. Cumpri minha função e nunca abri qualquer informação coberta pelo sigilo", garante o procurador que, à época, se sentiu fragilizado com a investida de Jucá. Ele lembra que como a denúncia estava fundamentada numa gravação telefônica sem autorização judicial, a Polícia Federal queria arquivar o caso. "Como saber se era verdade o que estava na fita sem investigar?", disse o procurador, hoje lotado no Espírito Santo.

A gravação chegou à Polícia Federal pelas mãos de um militante do PT de Cantá, Antônio Ailton da Silva, presidente da Central dos Assentados de Roraima (CAR), em carta entregue inicialmente à superintendência do Incra na região. Encontrado pelo Estado, Ailton disse que recebeu a fita das mãos do filho de um vereador, João do Trigo, e que só o conhece pelo apelido de Joãozinho. "Minha intenção foi ajudar a denunciar um esquema de corrupção, mas hoje sinto que estou sozinho", disse Ailton ao Estado. Segundo ele, depois que Jucá citou seu nome no Senado, o prefeito, num evento público, teria feito ameaças veladas.