Título: Cardeais desmentem dianteira de Ratzinger
Autor: Jamil Chade, José Maria Mayrink
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/04/2005, Vida &, p. A15

Segundo cardeais brasileiros, ninguém tem votação garantida, nem mesmo o alemão

Cardeais brasileiros e latino-americanos deixam claro: a disputa pelo poder no Vaticano ainda está em aberto, apesar das informações divulgadas nos últimos dias por jornais italianos de que os primeiros favoritos para suceder o papa João Paulo II já estariam começando a surgir. A poucos dias do início da eleição, os rumores são de que grupos de cardeais reformistas e conservadores começam a costurar suas posições e tentar encontrar candidatos. O primeiro dia de votação deve ser marcado pelo embate entre esses dois grupos. Ontem, o cardeal brasileiro Cláudio Hummes, cotado como possível candidato ao papado e que estava doente, voltou a participar das reuniões do Vaticano.

Nos últimos dias, os jornais italianos apontaram que o cardeal alemão Joseph Ratzinger estaria entre os favoritos e teria entre 40 e 50 votos entre os 115 cardeais eleitores. Em conversa com o Estado, o cardeal d. Falcão acha "improvável" todo esse apoio a Ratzinger. "Eu estava lá e não vi nada disso", afirmou.

Outro cardeal latino-americano, que falou ao jornal na condições do anonimato, também confirma a visão de d. Falcão e vai além: segundo ele, a resistência existente contra Ratzinger é importante e começa a se articular. Se essas projeções se confirmarem, a disputa pelo papado, pelo menos no primeiro turno, ficaria entre dois homens com características bem diferentes e representariam a divisão existente na Igreja.

De um lado, Ratzinger, com 77 anos, representa a doutrina conservadora do Vaticano. Próximo a João Paulo II, o alemão é criticado até por seus compatriotas e pelos americanos, que não querem ver um centralizador de poder no topo da Igreja. De outro lado estaria o cardeal Carlo Maria Martini, de 78, um reformista convicto.

Mas, para os analistas, o mais provável é que nenhuma das duas candidaturas sobreviva. As duas vertentes passariam a buscar nomes que pudessem conseguir dois terços dos votos, ou seja, 77 cardeais. Na avaliação dos vaticanistas, nessa hora é que o conclave começaria a funcionar e produzir suas obras.

Uma dessas "obras" poderia ser o italiano Dionigi Tettamanzi entre os reformistas. Com 71 anos, adota uma atitude de resguardar a teologia de forma conservadora e, ao mesmo tempo, lutar contra injustiças sociais. Além do italiano, a lista de segundas e terceiras opções inclui um latino-americano e o português José da Cruz Policarpo.

Já do lado dos mais conservadores, uma queda de Ratzinger poderia abrir espaço para cardeais como Camillo Ruini, o austríaco Christoph Schoenborn ou Angelo Scola, de Veneza.